Tribunais querem julgar ou interrogar 7900 homens, 1401 mulheres, além de 198 empresas. Indivíduos contumazes não podem obter novo cartão do cidadão ou efetuar registos.
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São os nomes que enchem os painéis de anúncios à entrada dos tribunais e em cujo cabeçalho se pode ler "Declaração de contumácia". Trata-se de homens e mulheres procurados pela Justiça por terem "desaparecido" e que passam a integrar uma lista de cidadãos contumazes. Este estatuto impede-os, por exemplo, de obter um cartão do cidadão, de ir ao médico do Serviço Nacional de Saúde ou de pagar uma simples fatura da EDP, sob pena de serem localizados e detidos. Nesta altura, há 15 178 pessoas e gerentes de empresas que devem prestar contas à Justiça, mas estão em parte incerta. A maioria dos casos tem que ver com crimes de condução sem carta ou sob efeito de álcool e há também procurados por furtos.
Desde de 2011 até hoje, as novas declarações de contumácia têm vindo a baixar, porque há cada vez menos pessoas a fugir e as forças policiais têm sido mais eficazes a localizá-las.
"A declaração de contumácia é proferida pelo magistrado judicial no decurso de um processo judicial relativamente à pessoa arguida que, não tendo prestado termo de identidade e residência, não foi possível notificar do despacho que designa dia para audiência de julgamento ou que não foi possível deter ou prender preventivamente para assegurar o comparecimento em audiência", explicou ao JN fonte da Direção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ). A medida estende-se "também à pessoa condenada que, dolosamente, se eximiu à execução de uma pena de prisão ou de uma medida de internamento", acrescenta.
Após ter verificado a ausência da pessoa, o juiz pode passar logo a declaração de contumácia, o que implica, automaticamente, a emissão de um mandado de detenção. Outro potencial efeito imediato é a anulação dos negócios jurídicos de natureza patrimonial celebrados após a declaração. Na esmagadora maioria dos casos, o tribunal decreta, ainda, a proibição de obter determinados documentos, certidões ou registos junto de autoridades públicas. O visado fica, assim, sem possibilidade de renovar o cartão de cidadão, o passaporte ou a carta de condução, e não pode praticar atos sujeitos a registo público (automóvel ou predial).
Logo que o arguido se apresente ou seja detido, cessa a situação de contumácia, por ordem judicial, bem como os seus efeitos, sendo eliminada da lista respetiva.
De acordo com os dados fornecidos pela mesma fonte, são procurados atualmente 7900 homens, 1401 mulheres e 5665 pessoas cujo sexo não foi comunicado pelos tribunais ao Sistema de Informação de identificação Criminal do Ministério da Justiça. Há ainda 198 empresas com declarações de contumácia pendentes.
Lisboa, Porto e Coimbra
Lisboa, Porto e Coimbra são os três distritos onde há mais pessoas declaradas contumazes. Durante o ano passado, os principais crimes referenciados das declarações eram a condução sem carta, seguido do furto (qualificado e simples), além de condução sob efeito do álcool. Segue-se a falsificação de documentos e no final do "top 10" surge o crime de burla qualificada.
Das 15 178 pessoas que a justiça procura, 11 138 têm entre 25 e 54 anos e 800 têm mais de 65 anos.
CASO
Histórico da viciação de veículos esteve 24 anos em fuga até ser preso
Era procurado pela Polícia Judiciária (PJ), pelo Serviço de Estrangeiros (SEF) e pela GNR desde 1995, data em que declarado contumaz e conseguiu sempre escapar ao radar das autoridades. Andou em fuga 24 anos, até ser localizado e detido em Lousada, em 2019. O indivíduo, de 55 anos, é considerado um histórico nos crimes de tráfico e viciação de veículos, com ramificações internacionais. É suspeito de liderar uma rede que furtava veículos em Portugal para os enviar para África, via Bélgica e Holanda. Todas as polícias andaram durante anos atrás de "Jerónimo", que chegou a estar na lista de procurados pela Interpol e Europol. Está indiciado por exportar carros furtados em Portugal. A sua especialidade eram os veículos utilitários e os jipes e os carros eram furtados por encomenda. "Jerónimo" tinha uma carteira de clientes e mandava cúmplices furtar as viaturas, sempre na Região Norte, que depois guardavam em vários armazéns, para serem alterados. Já com outras matrículas, os veículos seguiam para os portos de Antuérpia, na Bélgica, ou Roterdão, na Holanda. Está em prisão preventiva.
PORMENORES
Tendência de baixa
O número de novas declarações de contumácia tem vindo a baixar, desde 2011. Há mais pessoas a responder aos pedidos da Justiça e a eficácia das autoridades também tem vindo a aumentar.
Empresas
Depois de as empresas serem declaradas contumazes não podem realizar negócios sob pena serem considerados nulos. Também não podem obter certidões oficiais e as contas bancárias são congeladas.
Estrangeiros
Alguns dos procurados são detidos no estrangeiro, ao abrigo de cooperação policial. São repatriados para Portugal.