Intenção de serem indemnizados consta do processo à queda do GES. Um ano após ter saído a acusação, ainda corre prazo para pedir instrução.
Corpo do artigo
Oito fundos estrangeiros que emprestaram centenas de milhões de euros ao Banco Espírito Santo (BES) manifestaram oficialmente a intenção de exigir, no processo principal à queda do Grupo Espírito Santo (GES), ser indemnizados por Ricardo Salgado e outros arguidos, pelo dinheiro que perderam depois da resolução daquela instituição financeira, decidida pelo Banco de Portugal em 2014. Mais de mil lesados do BES e a massa insolvente de duas empresas do GES querem ser igualmente ressarcidas pelos acusados.
Um ano depois de, a 14 de julho de 2020, o Ministério Público (MP) ter deduzido acusação contra 18 pessoas e sete entidades coletivas, está ainda a correr, até ao início de setembro, o prazo para os arguidos pedirem a abertura da instrução do processo e, assim, tentarem evitar o julgamento. A obrigatoriedade, devido à existência de três arguidos suíços, de traduzir a acusação, com 4117 páginas, para francês ditou o prolongamento desta fase do processo, iniciado há quase sete anos.
Entre os oito fundos que querem ser indemnizados pelo ex-presidente do BES e outros arguidos, estão sete que, em dezembro, interpuseram em Lisboa uma ação administrativa contra o Estado português a contestar, na prática, a integração do seu empréstimo no "banco mau" e não no Novo Banco. Os credores - que, com aquela solução, ficaram praticamente sem hipótese de reaver o dinheiro - entraram então com mais ações contra outras entidades.
culpam por colapso
Em causa está, segundo notícias dos últimos meses, um financiamento de 835 milhões de dólares (cerca de 700 milhões de euros) feito, pouco antes da queda do BES, através de um veículo montado pelo grupo norte-americano Goldman Sachs.
O JN tentou, ontem à tarde, perceber junto dos mandatários dos oito fundos qual o montante global dos pedidos de indemnização cível e se estes já foram entregues, mas quer Paulo Farinha Alves quer José Maria Sanchez disseram não ter disponibilidade para falar.
Nos documentos públicos do processo principal à queda do BES, consultados na sexta-feira pelo JN, os advogados adiantam apenas que aqueles fundos emprestaram dinheiro ao BES, "tendo ficado privado[s] do montante mutuado devido ao colapso" do banco, "causado pelos arguidos".
salgado nega crimes
A alegada prática criminal de Salgado e outros acusados é, de resto, invocada também pelas massas insolventes de duas empresas do GES para justificaram a sua intenção de serem indemnizadas pelos arguidos. Terão, neste caso, ficado privadas de "vários ativos" que detinham no GES. Já os lesados do BES alegam ter tido o seu "património afetado" pelas condutas dos arguidos descritas nos autos.
O MP acredita que os arguidos causaram ao BES/ /GES prejuízos que ultrapassam os 11,8 mil milhões de euros. Os factos só foram detetados a partir de 2014, mas terão sido praticados nos anos anteriores.
Há um ano, Salgado, acusado de 65 crimes, negou, através dos seus advogados, a prática de qualquer crime, disse ter posto sempre "os interesses do BES acima de quaisquer outros" e acusou o MP de "falsificar a história" do banco. Considerou, ainda, que a resolução do BES foi "um erro colossal".
OPERAÇÃO MARQUÊS
Julgamento por desviar 10,7 milhões do GES já começou
Ricardo Salgado começou a ser julgado sozinho há uma semana, em Lisboa, por três crimes de abuso de confiança, num processo separado, em abril deste ano, da Operação Marquês. O ex-presidente do Banco Espírito Santo - que incorre numa pena até oito anos de prisão por cada crime - é suspeito de, em 2011, ter desviado 10,7 milhões de euros do Grupo Espírito Santo (GES) para a sua esfera pessoal, através de duas offshores no Panamá. Salgado contrapõe que em causa estão apenas "empréstimos". Inicialmente, o antigo banqueiro fora acusado, no âmbito da Operação Marquês, de 21 crimes, mas 18 acabaram por cair no final da instrução, incluindo três de corrupção ativa. O Ministério Público recorreu da decisão.