O Supremo Tribunal Administrativo (STA) vai decidir se a agente da PSP filmada a furtar roupa de uma loja no Centro Comercial Colombo, em Lisboa, vai ser ou não expulsa da força de segurança. A mulher-polícia intentou um recurso de uma decisão que havia validado a sua demissão e os juízes aceitaram agora apreciá-lo.
Corpo do artigo
Os conselheiros do STA admitiram o recurso de revista interposto pela agente da PSP porque dois tribunais - de primeira e segunda instância - já tinham analisado o caso, mas chegaram a conclusões diferentes sobre se era ou não inviável a manutenção da relação funcional, ou seja, o vínculo profissional da agente com a PSP. Mas também porque já houve decisões anteriores do Supremo Tribunal Administrativo sobre casos semelhantes com entendimentos diferentes.
O caso remonta a 14 de fevereiro de 2016, quando, cerca das 17 horas, a agente do efetivo da Divisão Policial de Cascais, que ingressou na PSP em 2005, passou as linhas de caixa de uma loja, sem pagar várias peças de vestuário desportivo, avaliadas em 188,25 euros, que tinha vestidas debaixo da roupa.
Confrontada com o furto, detetado através das câmaras de videovigilância, acabou por pagar a roupa. Inicialmente, a agente chegou a dizer que se tinha tratado de “uma espécie de compensação” pelo facto de a loja não ter reparado umas avarias em bicicletas que ali tinha adquirido. Mas, dois meses depois, mudou a versão, e invocou uma distração, mesmo tendo várias peças de vestuário ocultas debaixo da roupa.
Sem acusação pelo MP
O Ministério Público não a acusou no processo-crime, tendo-lhe apenas aplicado uma injunção, no âmbito de uma suspensão provisória do processo. Pagou 300 euros à ReFood Santo António. Mas, no processo disciplinar, acabou punida, em julho de 2018, com a sanção de demissão.
Em agosto desse ano, a agente intentou uma ação administrativa contra o Ministério da Administração Interna (MAI), pedindo a anulação do despacho do então ministro e a sua substituição por outro que lhe aplicasse uma sanção menos gravosa.
E, por sentença de 25 de fevereiro de 2022, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (TAF) deu-lhe razão, determinando a aplicação de “uma pena não expulsiva, por não se vislumbrarem indícios de inviabilização da manutenção da relação funcional”.
Na base desta decisão, estava o facto de o TAF de Sintra ter considerado que a agente cometeu o ilícito “fora das suas funções, não estando fardada nem identificada como agente da autoridade”, e ainda ter “a seu favor bom comportamento anterior e boa informação do seu superior hierárquico”.
Juízes falam em prejuízo para imagem da PSP
Inconformado com esta decisão, o MAI recorreu e o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) deu-lhe razão, tal como o JN noticiou. No acórdão, os juízes sustentaram que o tribunal de primeira instância “branqueou” o comportamento da autora.
Os magistrados do TCAS entenderam que o tribunal de primeira instância invocou mal a “inexistência de prejuízo para alguém, como se a concretização da infração dependesse do não pagamento das peças depois de confrontada com a consumação do furto”.
O tribunal superior também considerou que a primeira decisão “desconsidera em absoluto o prejuízo para a imagem da PSP e para a descredibilização da confiança da coletividade nessa instituição.”
Na decisão, o TCAS lembrou que “no caso, inexiste qualquer contexto conhecido relevante que possa explicar a ação”, entendendo que o furto foi “refletido”.
Revista admitida
Inconformada com a condenação que justificava a sua demissão, a agente da PSP recorreu então para o Supremo Tribunal Administrativo, que admitiu o recurso de revista e irá agora deliberar se confirma ou revoga o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul.
"Aparentemente, o decidido no acórdão recorrido não se afigura incorreto, mas por estar em apreço a questão das circunstâncias inviabilizadoras da relação funcional no âmbito das forças de segurança, relativamente à qual a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo ainda não está totalmente consolidada, justifica-se a derrogação da excecionalidade desta instância de recurso", referem os juízes Suzana Tavares da Silva, Teresa de Sousa e Fonseca da Paz, num acórdão a que o JN teve acesso.