O professor de português do homem que, em março de 2023, matou à facada duas mulheres no Centro Ismaili, em Lisboa, testemunhou esta quinta-feira, no julgamento, que a vítima mais nova, Mariana Jadaugy, se queixara de receber "mensagens pessoais" indesejadas do refugiado afegão.
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"A Mariana explicou-lhe que estava a trabalhar, [...] que era uma relação institucional", afirmou Diogo P., de 37 anos, que, no dia do ataque, foi igualmente esfaqueado por Abdul Bashir. Segundo a acusação do Ministério Público, o arguido, de 30 anos, enviaria igualmente mensagens íntimas não solicitadas à vitima mortal mais velha, Farana Sadrudin, e à princesa Aga Khan, filha do líder espiritual da comunidade ismaelita.
Durante a sessão da manhã, o cidadão afegão, em Portugal desde outubro de 2021, tinha já sido confrontado pelo tribunal com as mensagens que remeteu a Mariana Jadaugy, de 24 anos, e Farana Sadrudin, de 49, que ajudavam refugiados a integrar-se em Portugal. "Quem começou foram elas, e eu respondi", desvalorizou, num depoimento prestado com recurso a um intérprete da sua língua materna, farsi (persa).
No interrogatório, Abdul Bashir disse ainda ter agido em legítima defesa e em reação a uma "conspiração" entre os funcionários do Centro Ismaili e a família Aga Khan para o matar. Diogo P. faria, acredita, parte desse plano e tê-lo-ia ameaçado cerca de 20 dias antes - uma alegação que deixou o professor de português estupefacto.
Arguido "tinha faca na mão"
Esta quinta-feira, o formador recordou que, no dia do crime, estava a dar a aula da qual o arguido saíra mais cedo quando ouviu "um grito muito grande". Já fora da sala de aulas, cruzou-se com Abdul Bashir "com a faca na mão, coberto de sangue". Ainda apelou a que este parasse o que estava a fazer, mas o homem avançou na sua direção, sem dizer "nada". O professor foi atingido, mas conseguiu resistir e fugir. À saída, viu Mariana Jadaugy "a chorar no chão" do gabinete, com um corte profundo no pescoço e "as mãos cheias de sangue". Implorava por socorro.
Um outro aluno refugiado do curso de português quis ajudá-la, mas Diogo P. impediu-o. "Disse-lhe que não podíamos parar e agarrei-o", desabafou o professor de português, que acabou por se dirigir de carro ao Hospital de Santa Maria, localizado a cerca de um quilómetro do Centro Ismaili. Só este ano conseguiu voltar a trabalhar e continua a ter acompanhamento para lidar com as sequelas psicológicas.
O julgamento prossegue em 2025 no Tribunal Central Criminal de Lisboa, com a audição de mais testemunhas. Abdul Bashir foi detido no dia do crime e tem estado a aguardar o desenrolar do processo em internamento preventivo. O Ministério Público defende, na acusação, que é inimputável, por sofrer de doença mental, e, por isso, deve ser condenado a uma pena de internamento.
No total, responde por oito crimes de homcídios (dois consumados e seis tentados), dois de resistência e coação sobre funcionário e um de detenção de arma proibida.