O psicólogo forense Carlos Poiares afirma, ao JN, que o jovem português detido por instigar crimes no Brasil atuou num "quadro patológico". "Aproveitou-se de uma carga ideológica pesada, do nazismo, que está com um clima muito favorável em muitos países europeus, e tentou usar isso sem se queimar pessoalmente", diz.
Corpo do artigo
O que pode levar um jovem de 17 anos a ter este tipo de comportamentos?
É um problema de saúde mental, que não é só português, é um problema à escala mundial, que se reforçou com os efeitos da pandemia. São comportamentos que remetem para um quadro patológico, que deve ser observado e avaliado. Haverá muito a dizer, tendo em conta uma série de comportamentos graves, o apelo à automutilação, a tortura de animais e até, depois, um atentado.
Há aqui também um grande desejo de exibicionismo?
Sim, claramente. É o gosto de comunicar ao mundo o que fizeram. Há casos que são transmitidos pela internet. Tanto gostam de se exibir que é por aí que muitas vezes são apanhados.
É um adolescente. É normal que surjam estas tendências tão cedo?
Chega a haver casos até com rapazes mais novos. Dá-se uma evolução bastante rápida da patologia e do desenvolvimento.
Mesmo sendo tão novo, aparentemente, conseguiu assumir um papel de liderança no grupo...
Conseguiu condicionar uma série de pessoas que também não estarão muito bem. Estão em idades de transformação física e mental onde há maior vulnerabilidade. É um caso bastante mais grave do que o da Faculdade de Ciências. Tem uma elaboração mais inteligente; a forma hábil como conseguiu que outros cometessem um atentado. Agiu através de uma espécie de telecomando. Promover crimes, instigar e aplaudir, mas sem meter as mãos na massa.
E como se consegue esse convencimento?
Neste caso, aproveitou-se de uma carga ideológica pesada, do nazismo, que está com um clima muito favorável em muitos países europeus, incluindo Portugal. Embrenhou-se numa ideologia extremista e tentou usar isso sem se queimar pessoalmente. Aparentemente, estava convencido de que não lhe ia acontecer nada. Felizmente que está detido e não poderá cometer mais esses atos.
Há formas de prevenir e detetar estas tendências?
É necessário atual preventivamente através da escola. Uma escola guarnecida em termos de saúde mental, com psicólogos que possam atuar preventivamente, é uma grande arma. Se houvesse psicólogos minimamente atentos, aperceber-se-iam de que algo não estava bem. Há dois, três ou quatro anos já poderia ter sido detetado.
Seria fácil de detetar?
Claro que podemos estar a falar de um caso de abandono, insucesso escolar, ou até marginalizado do meio escolar. Não será o único. Preocupa-me que outros possam estar na calha e com esta projeção até poderá ser um gatilho para outros. Há que ter cuidado para não confundir protagonismo com estatuto.Há que estar atento e uma prevenção rigorosa. Não em termos policiais, mas no campo da pedagogia e da educação.