A juíza de instrução criminal considera que o Presidente da República praticou atos "que não são neutros" no caso das gémeas. No despacho enviado ao Supremo Tribunal de Justiça, citado pelo Expresso, questiona-se mesmo porque é que o Ministério Público (MP) não considerou, ainda que em abstrato, investigar Marcelo.
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Segundo a juíza Gabriela Assunção, o MP descreve "a prática de atos, atribuíveis a Sua Excelência, o Senhor Presidente da República, que não são neutros em relação aos atos imputados aos suspeitos". Aliás, o MP imputa um crime de prevaricação ao filho do Presidente, mas, frisa a magistrada judicial, Nuno Rebelo de Sousa não é "titular de cargo político e nunca poderia intervir no exercício das suas funções". Portanto, o Presidente é que poderia ser investigado por coautoria deste crime, assinala.
O despacho é bastante crítico para com a atuação do MP especialmente por não ter "levado a cabo (...) qualquer enquadramento jurídico quando à atuação de (...) Marcelo Rebelo de Sousa" e defende que apesar de "não ter a mesma competência (...) que teria o suspeito António Lacerda Sales (...) não se vislumbra como é que se pode não ponderar, ainda que abstratamente, a convocação do artigo 28.º do Código Penal também para a atuação que o MP descreve e imputa ao Presidente da República, como fez quanto ao suspeito Nuno Rebelo de Sousa". O artigo em citado refere-se precisamente à cumplicidade e comparticipação em crimes.
A juíza recorda que Nuno Rebelo de Sousa contactou o Presidente a pedir apoio no caso de duas crianças cujos pais "são muito amigos de uns amigos nossos". "O pai pode ajudar?", solicitava o filho ao Presidente. Marcelo reencaminhou o mail para o seu chefe da Casa Civil, questionando se a sua assessora para os Serviços Sociais podia "perceber o que se passa".
Após saber do que se tratava, o chefe da Casa Civil informou o filho do Presidente que, depois de terem contactado o hospital, acharam "adequado envolver o Governo, pois a gestão das listas de espera é da responsabilidade do Ministério da Saúde". Segundo o MP, foi então que Nuno Rebelo de Sousa, "sabendo das diligências já feitas" e "aproveitando-se do facto de ser filho do Presidente da República", contactou Lacerda Sales que viria a marcar as consultas.
Para a juíza, Marcelo Rebelo de Sousa acabou por ter um papel relevante porque foi o seu chefe da Casa Civil que fez a ponte entre a Presidência e o Governo, conseguindo assim o agendamento da tão desejada consulta. O despacho da juíza Gabriela Assunção a admitir a investigação da atuação do Presidente no caso das gémeas foi enviado para o Supremo Tribunal de Justiça que, todavia, rejeitou liminarmente o requerimento.
Ainda segundo o "Expresso", o juiz conselheiro Celso Manata argumentou que o titular da ação penal é o Ministério Público, "sendo ao mesmo que cabe iniciar procedimentos criminais e promover as diligências para o efeito pertinentes". O que não aconteceu. Além disso, prossegue o conselheiro, um procedimento criminal contra o Presidente necessitaria sempre de uma autorização da Assembleia da República.