Relação de Guimarães contraria sentença do Tribunal de Chaves que preconizava reaproximação familiar.
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Um homem de Bragança foi impedido pelo Tribunal da Relação de Guimarães (TRG) de estar com o filho, hoje com 12 anos, atendendo a que, até maio de 2016, cometeu maus-tratos sobre ele, pelos quais seria condenado num processo-crime. O recente acórdão da Relação reverteu uma decisão proferida pelo Tribunal de Chaves, num processo de regulação das responsabilidades parentais, que pugnou pela reaproximação entre pai e filho, terminada que estava a proibição de contactos determinada no processo-crime.
A mãe do menor recorreu da decisão de Chaves, levando os desembargadores do TRG a recordarem, no seu acórdão de novembro último, o que se passou até maio de 2016. O pai, João E., agrediu repetidamente o menor com bofetadas e pontapés, às vezes com tal força que o atirava ao chão, e fechava-o num quarto, horas a fio, em pranto. À noite, se o filho chorava, também lhe ralhava e gritava. Não revelava qualquer carinho e, apesar de estar desempregado, nunca cuidava do filho nem brincava com ele, levando-o para casa da mãe.
"Quando tinha apenas um ano de idade, e em altura em que se encontrava aos seus cuidados durante o dia, pois a mãe trabalhava, foi encontrado desidratado, desnutrido e com princípios de anemia, tendo dado entrada no Hospital, onde permaneceu internado", destacou também o TRG, na exposição de um rol de condutas inadequadas do progenitor, que passaram, ainda, por este "não ter visitado o filho, hoje com 12 anos, enquanto esteve internado", e ter justificado que "o menor era responsabilidade da mãe".
"Uma criança triste"
Tais condutas do pai, mais os atos de violência doméstica também contra a mulher, prolongaram-se por seis anos, acabando por ser punidas, em 2016, com uma pena de prisão, suspensa na sua execução, e uma pena acessória de proibição de contactos com o filho, por dois anos.
Daquele modo, disse o TRG, "causou ao filho, hoje com 12 anos, alterações do foro emocional (tristeza, ansiedade, alteração do sono, baixa de autoestima e perturbação da articulação verbal), enurese [incontinência urinária], perturbações do sono, dores, angústia, humilhação, tristeza, intranquilidade e ansiedade". O menino tornou-se "uma criança triste e nervosa", sublinhou a Relação.
O acórdão do TRG foi proferido num processo iniciado pela mãe do menor. Cumpridos os prazos de suspensão da pena e de proibição de contactos, a mulher pediu ao tribunal de Chaves que mantivesse o pai afastado do filho.
O pai alegou então que os maus-tratos tinham parado por força do processo-crime e, em 2021, o Tribunal de Chaves decidiu não decretar a inibição do exercício das responsabilidades parentais, contrariando a mãe e o Ministério Público. O Tribunal de Chaves sublinhou que os crimes tinham sido praticados em 2015 e/ou 2016 e a presente ação tinha dado entrada em Outubro de 2021. "Logo, nesta data, o pai estava e permanecia sem conviver ou sequer visitar o filho há, pelo menos, cinco anos", assinalou.
Porém, confrontada com o recurso, a Relação de Guimarães entendeu que o pai continua a não ter, ainda hoje, "condições para exercer as responsabilidades parentais, devendo ser judicialmente inibido". "Os comportamentos descritos revelam ausência de amor pelo filho e, igualmente, traços de personalidade que não são compatíveis com o cumprimento dos deveres de pai", justificaram os desembargadores, não entendendo como é que o juiz do Tribunal de Chaves concluiu que, cinco anos depois, João E. já tem "condições de cumprir com os seus deveres enquanto pai".
Queixa-crime após fuga para casa-abrigo
Em 2016, perante a violência do companheiro, a mãe e o filho refugiaram-se numa casa-abrigo. Após a queixa-crime, o homem foi condenado em Chaves na pena de prisão de quatro anos e dois meses, suspensa, por violência doméstica sobre a mulher e o filho. Foi ainda proibido de contactar o filho durante dois anos.
Responsabilidades
Criança vive com a mãe e a avó
Desde maio de 2016 que o menor não tem contacto com o pai. Desde então, cresceu e vive aos cuidados da mãe e da avó paterna, sendo estas que lhe proporcionam as necessárias condições de saúde, educação e equilíbrio emocional.
Progenitor só insultava e agredia
A mãe alegou em tribunal que o ex-companheiro "nunca fomentou o desenvolvimento físico, intelectual e moral do filho, antes pelo contrário, agredia-o e insultava-o com frequência, o que configura uma infração culposa dos seus deveres para com ele".