São testemunhas com uma importância crucial para a Justiça. As informações que estão dispostas a dar colocam-nas em risco de vida. E também às suas famílias. Trata-se de 17 testemunhas e 10 familiares, num total de 27 pessoas.
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Rui Pinto, que aceitou colaborar com a Justiça e a Polícia Judiciária em diversos processos de crimes económico-financeiros, é uma das testemunhas que beneficiam atualmente destes programas confidenciais, onde tudo é feito sem telefonemas, nem e-mails.
No âmbito destes programas especiais, o Estado permite mudar radicalmente de vida, com alteração de morada, de nome, de profissão e até de rosto, com a realização de cirurgias plásticas.
A Comissão de Programas Especiais de Segurança, que não tem instalações físicas conhecidas precisamente para manter o secretismo, recebe, em média, por ano, apenas três pedidos de implementação de programas especiais de segurança. É que apenas entram nos programas testemunhas credíveis, com contributos importantes para a descoberta da verdade, devendo ser consideradas ferramentas essenciais na luta contra o crime organizado. Também o risco de vida para as testemunhas ou seus familiares tem de ser comprovado.
Perigosidade
Entre 2003 e 2019, beneficiaram de programas especiais de segurança 93 pessoas. Entre elas, estão 47 testemunhas e 46 familiares. Atualmente, das 17 testemunhas protegidas, sete não têm nacionalidade portuguesa, mas ajudaram a Justiça nacional a prender criminosos de alto gabarito e perigosidade. Todas estas pessoas passaram por um apertado crivo de verificação das informações de que dispõem e que podem ajudar as autoridades. Tudo começa com um juiz ou um magistrado do Ministério Público que, por entender existir sério perigo de vida para a testemunha, faz um pedido à Comissão. Quase em tempo real, porque quando as pessoas correm perigo de vida não há tempo para perder, é dado um primeiro parecer. Se for positivo, e depois de merecer aceitação pela testemunha, em poucos dias o beneficiário e os familiares são colocados numa nova casa - no estrangeiro, se a situação assim o exigir - e com um subsídio para fazer face a despesas. Mais tarde, a Comissão até pode ajudar a encontrar um emprego, para que, aos poucos, a testemunha se torne autónoma e "livre".
Processos de mão para mão
Toda a tramitação do processo é feita sem recurso a telefonemas, nem comunicações eletrónicas. Tudo se passa cara à cara e os dossiês são passados de mão a mão para evitar que as redes criminosas consigam, através de pirataria informática, ter acesso às informações sensíveis.
"Os crimes que determinaram a aprovação e implementação dos programas especiais de segurança foram os de corrupção, tráfico de pessoas, tráfico de estupefacientes, lenocínio, homicídio, sequestro, violência doméstica e crimes contra a liberdade ou autodeterminação sexual, na sua grande maioria em contexto de suspeita de associação criminosa", adiantou ao JN fonte da comissão, liderada pelo juiz conselheiro jubilado Armando Leandro.
Cerca de 80% dos casos reportam-se ao crime de tráfico de estupefacientes, 10% ao crime de corrupção e os restantes 10% repartidos pelos diversos ilícitos que permitem acesso aos programas. Há casos em que "para a aprovação de um processo especial de segurança poderão ter sido indiciados mais do que um tipo de crime", precisou a mesma fonte.
A esmagadora maioria dos beneficiários (96%) trocaram de local de residência e cerca de 30% mudaram de identidade.
A comissão não tem um orçamento próprio. As despesas que aparecem são sempre suportadas pelo Ministério da Justiça e as outras entidades que colaboram com estes programas.
Números
93 testemunhas e familiares entraram em programas especiais de segurança, desde 2003.
30% das pessoas que foram protegidas pela Justiça mudaram de identidade, com novos documentos.
96% dos beneficiários tiveram de mudar de residência porque corriam perigo efetivo de vida.
17 testemunhas e dez familiares estão atualmente a serem salvaguardados pelo Estado.