O professor universitário Francisco Louçã testemunhou esta sexta-feira, em tribunal, que olhou "com naturalidade" para a afirmação do ativista antirracista Mamadou Ba de que o militante de extrema-direita Mário Machado foi "uma das figuras principais do assassinato", em 1995, do jovem negro Alcindo Monteiro, no Bairro Alto, em Lisboa.
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Mamadou Ba, de 49 anos, está a ser julgado, há cerca de um mês, no Tribunal Local Criminal de Lisboa, por ter alegadamente difamado Mário Machado com essa declaração, publicada em junho de 2020 nas redes sociais.
O militante neonazi, hoje com 46 anos, fazia parte do grupo de "cabeças-rapadas" que, na noite de 10 para 11 de junho de 1995, atacou vários cidadãos no Bairro Alto por serem negros, mas, em julgamento, foi absolvido do homicídio de Alcindo Monteiro e condenado por outros crimes, pelos quais cumpriu pena de prisão.
Esta sexta-feira, Francisco Louçã, chamado a depor pelo arguido, lembrou que o acórdão então proferido, do qual citou vários excertos, "confirma a culpabilidade grupal" dos atos praticados naquela madrugada.
"Olhei para essa frase com a naturalidade de evocação do tempo preciso que se viveu nessa altura", acrescentou o fundador do Bloco de Esquerda e antigo conselheiro de Estado (2016-2022), sublinhando que, para si "como para muitas pessoas na época, o assassinato foi muito traumático". "Não é muito comum em Portugal assistir-se a um assassinato numa partida de caça", justificou.
Últimas testemunhas
Além de Francisco Louçã, testemunharam ainda esta sexta-feira os professores universitários Cristina Gomes da Silva e Miguel Vale de Almeida e a jornalista Diana Andringa, tendo todos assinalado o papel de Mamadou Ba na luta contra o racismo em Portugal e pela democracia nas últimas décadas.
"Mário Machado não é alvo das minhas preocupações em particular, mas sim o que representa enquanto projeto de sociedade", assegurara a 10 de maio de 2023, na primeira sessão do julgamento, o ativista, à data dos factos dirigente do SOS Racismo. Na audiência seguinte, o militante de extrema-direita assegurou que tem "muito orgulho em ser nacionalista". "Esse orgulho não pode ser suficiente para valer tudo e para me chamarem assassino", acrescentou.
O julgamento prossegue a 14 de julho de 2023, com as alegações finais, destinadas à apresentação de conclusões pelo Ministério Público, pela defesa de Mamadou Ba e pelo mandatário de Mário Machado. A sessão seguinte, ainda por agendar, será à partida para a leitura da sentença do tribunal. Em caso de condenação, a pena aplicada poderá ser, segundo o Código Penal, de prisão ou de multa.