Luís Filipe Vieira e Benfica SAD julgados por esquema para fazer circular dinheiro

Luís Filipe Vieira, ex-presidente do Benfica
Amin Chaar / Global Imagens
O Tribunal Central de Instrução Criminal confirmou, esta terça-feira, a ida a julgamento de Luís Filipe Vieira, ex-presidente do Benfica, da SAD do clube e de outros sete arguidos por terem, alegadamente, montado um esquema de prestação fictícia de serviços para fazer circular dinheiro na esfera encarnada.
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Em causa estão montantes superiores a um milhão de euros e que, na tese do Ministério Público, se destinariam a um "saco azul", cuja existência nunca foi constatada nem demonstrada pela investigação. O esquema terá sido posto em prática entre dezembro de 2016 e dezembro de 2017.
"Foi uma decisão com que não contávamos. Agora resta-nos a alternativa de ir, naturalmente, para julgamento e aí discutir, prova a prova, e suportar a inocência dos nossos clientes, como pugnamos", reagiu, à saída do tribunal, em Lisboa, o advogado que representa os arguidos do universo benfiquista, João Medeiros.
Na leitura da decisão instrutória, o juiz Jorge Bernardes de Melo considerou que está "suficientemente indiciado" que o "plano foi da iniciativa" de Luís Filipe Vieira, ao qual terão depois aderido Domingos Soares de Oliveira, então administrador da SAD do Benfica, e Miguel Moreira, à data diretor financeiro dos encarnados.
Na prática, descreve a acusação, as empresas Benfica SAD e Benfica Estádio terão transferido 2,2 milhões de euros, com a correspondente emissão de faturas, para a empresa Questão Flexível, pelo pagamento de serviços de consultadoria informática que nunca terão sido prestados. Posteriormente, o sócio-gerente desta última, José Bernardes, terá entregado 1,4 milhões de euros em numerário a Miguel Moreira, tendo, nesse momento, a verba reentrado na esfera do Benfica, para fins que ficaram por apurar.
Além das três sociedades, dos três arguidos ligados ao Benfica e de José Bernardes, o esquema contou ainda com mais dois intermediários, um dos quais sócio-gerente de uma empresa sediada no Senegal. Agora, serão os nove julgados por crimes, em geral, de fraude fiscal qualificada e de falsificação de documento.
Contratos "simulados"
Na instrução, a defesa dos arguidos da esfera do Benfica, incluindo de Luís Filipe Vieira, alegara que os serviços em causa foram "reais", relacionados, por um lado, com a arquitetura do sistema informático dos encarnados e, por outro, com "a alta disponibilidade" em caso de existir um "crash". A tese não convenceu, porém, o juiz Jorge Bernardes de Melo, para quem está "suficientemente indiciado" que os contratos com a Questão Flexível foram "simulados" para "justificar a saída de dinheiro" das contas da Benfica SAD e da Benfica Estádio.
Entre outros aspetos, o magistrado salientou, esta terça-feira, que, à data, a Questão Flexível "não dispunha de recursos humanos que pudessem sustentar os serviços supostamente prestados" àquelas sociedades, nem há evidências de qualquer subcontratação. Destacou, ainda, que a documentação apreendida nas buscas à sua sede indiciam, pela sua desorganização, que esta se trata "de uma empresa de fachada, sem qualquer atividade".
Para o magistrado, está também “suficientemente indiciado” que as verbas transferidas para a empresa de José Bernardes “retomaram em numerário ao grupo Benfica, de forma oculta, através de Miguel Moreira”. O sócio-gerente da Questão Flexível reteria uma “comissão de 11%”, que, segundo a acusação do Ministério Público, seria distribuída pelos restantes intermediários no esquema.
Embora a investigação não tenha conseguido apurar o destino final dos montantes, o esquema terá lesado o Estado, quer através da "dedução indevida de IVA", quer através da declaração em sede de IRS da prestação de serviços presumivelmente inexistentes.
Negada suspensão do processo
Esta terça-feira, Jorge Bernardes de Melo rejeitou, paralelamente, ordenar a suspensão provisória do processo, que tinha sido requerida, em caso de pronúncia (acusação após instrução), por alguns dos arguidos. "O grau de culpa é elevado", sustentou, invocando, nomeadamente, a "sofisticação" do esquema e os "elevados montantes" em causa. O magistrado considerou, de resto, "altamente provável a condenação" dos arguidos.
"É um imperativo legal. Um juiz de instrução que se preze só pode enviar [para julgamento] se houver mais probabilidade de condenação do que de absolvição", desvalorizou, à saída da sala de audiência, João Medeiros.
