O Tribunal da Relação de Évora absolveu uma seguradora que tinha sido condenada a pagar uma indemnização de cerca de cem mil euros a um médico que foi atropelado em Portimão, em 2017. A vítima acusou uma taxa de alcoolemia de 2,20 e foi considerada culpada pelo atropelamento.
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O acidente aconteceu a 8 de abril, pelas 22.13 horas. Nessa altura, o clínico, de 29 anos, seguia numa faixa de rodagem, fora do passeio, quando foi atingido com violência por um Mercedes que seguia da Praia da Rocha para Portimão. Quando se apercebeu do peão na via, o condutor tentou desviar-se, mas, "quando ia a passar pelo mesmo, este virou-se para a frente repentinamente, desequilibrou-se para o seu lado direito e invadiu ainda mais a faixa de rodagem", refere o acórdão.
Dada a imprevisibilidade do comportamento, o condutor não conseguiu evitar o embate e o médico foi projetado para o chão. Transportado para o Centro Hospitalar da Universidade do Algarve, em Portimão, foi depois transferido para outra unidade, onde esteve internado durante 64 dias.
No momento do acidente, o médico estava acompanhado de amigos, que seguiam mais atrás, mas no passeio. Submetido a teste de alcoolemia, acusou uma taxa de 2,20. Antes, tinha estado numa festa de aniversário, na qual tinha ingerido diversas bebidas alcoólicas, "desde o início da tarde até perto da hora do acidente".
Na ação que intentou contra a seguradora, a vítima exigia cerca de 144 mil euros, mais juros, por danos patrimoniais, não patrimoniais e futuros, mas o tribunal de primeira instância atribuiu-lhe apenas cerca de 92 mil euros, mais juros e eventuais despesas de saúde de que ainda viesse a necessitar por causa do acidente.
A seguradora recorreu, alegando, em síntese, que o atropelamento tinha sido da exclusiva responsabilidade do peão, "que seguia na faixa de rodagem, animado pela influência do álcool no sangue, tendo-se desequilibrado e invadido ainda mais a faixa de rodagem por onde circulava o veículo". A Relação revogou a decisão. Para as juízas desembargadoras Isabel Imaginário, Maria Simões e Ana Leite, o condutor agiu com a prudência devida pelo que não era previsível que o peão, perante a aproximação do veículo, invadisse ainda mais a faixa de rodagem.
"Está provado que a conduta do peão foi imprevisível e repentina, e que essa conduta repentina é que foi causal do embate. Embate que o condutor não pôde evitar", lê-se no acórdão, que conclui que o médico não observou os deveres de cuidado que lhe eram impostos.
Dever de buzinar
As desembargadoras não acompanharam os argumentos antes dados como provados de que o condutor do Mercedes devia ter parado o veículo antes de se aproximar do peão e buzinado, alertando-o para a sua presença e dessa forma tentar evitar o embate. "Está por demonstrar que o acionamento da buzina desencadeasse conduta diversa no peão naquele concreto enquadramento", alegaram.
Pormenores
Não violou deveres - Para o tribunal, o condutor seguia a velocidade adequada (cerca de 40km/h) e a distância suficiente dos passeios que evitasse acidentes. O acidente ocorreu numa via reta, com boa visibilidade e presença de sinalização de aproximação de lombas.
Profissão adiada - Devido ao acidente, o médico alega ter ficado impossibilitado de estudar e de realizar o exame Harrison, que dita a ordem pela qual os médicos escolhem a especialidade.
Cinco intervenções - Desde o dia do acidente, o médico foi sujeito a, pelo menos, cinco intervenções cirúrgicas e fisioterapia.