Ex-trabalhadores dos TLP já tinham morrido quando a empresa intentou a ação cível. O Supremo Tribunal de Justiça absolveu herdeiros de pagar indemnização.
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A Meo quis receber 30 435 euros de dois antigos funcionários dos TLP (Telefones de Lisboa e Porto), que morreram em 2013 e 2015, devidos por acordos de pré-reforma que teriam sido celebrados com ambos os trabalhadores em 1996. A empresa pagou-lhes prestações da pré-reforma, entre 2005 e 2006, na expetativa de que tivessem pedido a aposentação na primeira das datas (o que não aconteceu), e o acerto de contas seria feito diretamente com o Centro Nacional de Pensões (CNP). Mesmo tendo conhecimento dos factos desde 2006, a empresa só recorreu ao Tribunal em 2018.
Com a morte dos antigos funcionários, a Meo tentou reaver as quantias intentando uma ação cível contra os filhos, na qualidade de herdeiros, e o Tribunal da Relação (TR) deu-lhe razão, após uma decisão em sentido contrário do Tribunal de Primeira Instância em maio de 2019. Este decidiu-se pela prescrição dos factos, pois entendeu tratar-se de uma ação "fundada em enriquecimento sem causa", e absolveu os filhos dos antigos funcionários.
Inconformada, a empresa recorreu da sentença e o TR determinou que o processo prosseguisse para apuramento dos termos dos acordos alegadamente celebrados com os antigos funcionários e se tinha ou não havido incumprimento.
No final, os familiares foram novamente absolvidos, mas o TR, em resposta a um segundo recurso da Meo, afirmou que "era com base no regime do benefício parassocial a que a Autora (Meo) se vinculara e a que os pais dos RR (réus) acederam que a Autora poderia exigir dos RR. A restituição das ditas prestações efetuadas a título de adiantamento de prestações pensionísticas". E condenou os herdeiros dos dois antigos funcionários a pagarem 30 217 euros, acrescidos de juros de mora.
Diferente entendimento teve, porém, o Supremo Tribunal de Justiça, ao qual os herdeiros recorreram, conforme se pode ler em acórdão a que o JN teve acesso.
Sem obrigações
O Supremo considerou que a Meo efectuou determinadas prestações "a título de benefício parassocial aos seus ex-trabalhadores, prestações que funcionariam apenas como uma antecipação, sujeita a ressarcimento pelo terceiro Centro Nacional de Pensões".
Esse benefício, refere o STJ, foi "aceite sem a assunção de quaisquer obrigações dos ex-trabalhadores, designadamente sem a obrigação de requerer a pensão de reforma em determinada data". Diz o Supremo que "não é de uma relação contratual estabelecida com a Autora que pode emergir, para os ex-trabalhadores, a obrigação de devolução de quantias pagas pela Autora e que não vieram a ser ressarcidas pelo Centro Nacional de Pensões".
De igual modo, o Supremo considerou estar-se perante um enriquecimento ilícito, prescrito à data em que a ação foi intentada.
Pormenores
Empresa tentou ao fim de 10 anos
A Meo tentou, em agosto e setembro de 2016, interpelar os dois funcionários para a devolução das quantias. Mas um deles havia morrido no ano anterior e o outro em 2013.
Acordo de pré-reforma
Os dois funcionários assinaram um acordo que os dispensava da prestação de trabalho, ficando a entidade patronal obrigada a pagar-lhes durante o período da suspensão do contrato uma quantia mensal equivalente a 80% do seu vencimento ilíquido.
Adiantamento da pensão
Era prática da Meo efetuar um adiantamento correspondente à estimativa da respetiva pensão de reforma. Era pago aos antigos trabalhadores entre a data em que passavam a ser considerados requerentes da pensão e o seu deferimento.