O Tribunal de Instrução Criminal de Braga decidiu não levar a julgamento o capitão da GNR Orlando Mendes e o guarda António Antunes, que tinham sido acusados, respetivamente, de crimes de prevaricação e denegação de justiça e de um crime de ofensas à integridade física qualificada, por factos ocorridos durante uma operação stop, em Vieira do Minho. Também não foi pronunciado o automobilista José Vieira que, segundo aqueles militares GNR, não tinha obedecido a ordens e teria reagido com injúrias e ameaças.
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Na origem do caso está uma operação stop do Destacamento da GNR da Póvoa de Lanhoso, em 2021, que não acabou da melhor maneira e se destinaria a confirmar que era José Vieira quem, devido a quezílias antigas, andaria a atirar embalagens da cadeia de comida McDonalds para o quintal de António Antunes, guarda do Posto da GNR de Vieira do Minho e também arguido neste processo.
Na madrugada de 10 de abril de 2021, foi mobilizado um alargado dispositivo da GNR, entre Braga e Vieira do Minho, numa distância de cerca de 30 quilómetros. Depois de ir a um restaurante Mc Donalds, o suspeito foi seguido pelos militares, que pretendiam surpreendê-lo em flagrante delito.
Só que a operação não terá corrido como desejado, uma vez que José Vieira, a meio do caminho entre Braga e Vieira do Minho, quando seguia com três amigos, parou e depositou as embalagens daquela cadeia de "comida rápida" num caixote do lixo da Estrada Nacional 103, na Póvoa de Lanhoso.
Mesmo assim, segundo os autos consultados pelo JN, a operação policial continuou até à entrada de Vieira do Minho. Na rua onde mora o guarda Antunes, foi dada ordem de paragem ao automobilista e arguido José Vieira.
A partir de então, a situação complicou-se, dando azo a versões antagónicas que acabariam por justificar o despacho de não pronúncia proferido, na semana passada, pelo Tribunal de Instrução Criminal de Braga.
Provas insuficientes
Para a juíza de instrução titular do processo, não existem provas suficientes de que, a seguir àquela operação, o capitão Orlando Mendes (agora a comandar o Destacamento da GNR de Guimarães) se tenha recusado a aceitar uma queixa de José Vieira, por agressões alegadamente perpetradas pelo guarda António Antunes, que não estava de serviço, mas saiu de casa e juntou-se aos colegas que executavam a operação policial.
Por outro lado, o tribunal também não deu crédito ao teor da participação da GNR de Vieira do Minho, que imputava ao automobilista doze crimes, de ameaças e injúrias agravadas, desobediência qualificada, resistência e coação.
No auto de notícia constava, por exemplo, que o condutor do veículo se tinha agarrado ao volante, mas, ao mesmo tempo, empurrado um dos guardas. "Como explicar que alguém, sentado dentro de um automóvel, agarrado ao volante, assim como foi descrito, consiga desferir um empurrão a alguém, no caso um militar da GNR, que se encontrava no exterior do veículo?", questionou a juíza, no despacho de não pronúncia.
A magistrada também não deu como indiciado que o automobilista tenha injuriado e proferido ameaças contra os elementos afetos ao Comando Territorial da GNR de Braga, porque os depoimentos dos militares não mereceram a necessária credibilidade, devido a incongruências apontadas pela juíza.
Sobre os "quatro crimes de ameaça agravada" imputados a José Vieira, a juíza questionou-se sobre "a quem as ameaças se dirigiam em concreto", nem concluiu "com uma certeza inabalável que ameaças em concreto" fez o automobilista.
Testemunhas sem credibilidade
"Quem fala verdade? Os senhores militares por serem militares, oferecem mais credibilidade testemunhal?", duvidou a juíza, questionando, também, se as testemunhas do automobilista "depuseram de modo mais fidedigno".
A magistrada considerou que as funções profissionais do guarda podem ter levado os seus camaradas, testemunhas no processo, a "deporem de modo corroborante com a prestação do depoimento daquele", em jeito de "solidariedade militar". E considerou isso "compreensível, mas não justificável", pois estão em causa elementos de um "órgão de polícia criminal, a quem se exige a demonstração de uma completa isenção, espelhada não pela sua veste profissional, singelamente considerada, mas igualmente por atos condizentes com a inerência do seu próprio cargo", salientou.
De resto, a juíza também não reconheceu credibilidade às três testemunhas que seguiam no automóvel do condutor, concluindo que os seus depoimentos se pautaram "unanimemente por uma descrição dos factos de modo protecional relativamente a José Vieira, igualmente compreensível, mas não justificável".