Contradições entre declarações à PJ e as feitas agora no julgamento de padre e três religiosas de Famalicão por escravizarem noviças.
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O Ministério Público (MP) do Tribunal de Guimarães mandou abrir um inquérito a uma religiosa, de 66 anos, por falsidade de testemunho, depois das declarações que a mesma prestou ontem, no julgamento das três religiosas e do padre da Fraternidade Cristo Jovem, de Requião, em Famalicão, acusados de escravizarem "noviças" durante anos.
A procuradora da República considerou que a irmã Ana Barbosa, ouvida por videoconferência por estar atualmente num convento das irmãs Clarissas, com votos de clausura, prestou "declarações contraditórias" com as que fizera à Polícia Judiciária, durante a investigação. Advertida pelo tribunal, manteve o que disse em julgamento.
Sobre a vida naquela comunidade - onde esteve em 1976, quando tinha 21 anos - e a existência de agressões a testemunha referiu que "não viu nada de exageros" e que "era a mentalidade da época". O MP e a juíza interrogaram-na então sobre uma agressão de que teria sido alvo por parte do padre Milheiro. "Isso não foi nada. Só deu com a mãozita na cara", desvalorizou, contrariando o que havia declarado anteriormente. A procuradora ainda requereu a leitura do depoimento à PJ, mas o advogado de uma das arguidas opôs-se, inviabilizando a diligência. O MP extraiu certidão para que seja investigado à parte um eventual crime de falsidade de testemunho.
Sequestro inventado
Na audiência de ontem testemunhou ainda a irmã de uma das alegadas vítimas da escravatura. Contou ao tribunal que, depois da denúncia sobre os alegados maus- -tratos, ela foi passar oito dias a casa da família, e aconteceu um episódio que os deixou atónitos. "Dois dias depois, a irmã Isabel apareceu com a GNR a dizer que a tínhamos fechada em casa e não a deixávamos voltar", afirmou. "Mas, ela disse à GNR que queria ficar".
A familiar acabaria por regressar ao "convento", por causa da "fé" e porque a "pessoa que fazia as coisas piores tinha saído" da instituição, explicou a testemunha ao tribunal.
Pormenores
Crimes
As "freiras" - Isabel, Arminda e Joaquina - e o padre respondem por nove crimes de escravatura. Vítimas pedem indemnizações de milhares de euros.
Início em Braga
A Fraternidade Cristo Jovem funcionou no Sameiro, Braga, antes de se mudar para a propriedade a que chamam "convento" em Requião, Famalicão