Os titulares do caso de corrupção nos negócios do Estado com a Octapharma fizeram escutas telefónicas aos ex-secretários de Estado da Saúde Manuel Pizarro e Francisco Ramos, mas não recolheram provas que permitissem acusá-los de crime.
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O Ministério Público (MP) concluiu que a Octapharma manteve o domínio do fornecimento de hemoderivados, durante mais de uma década, não por culpa daqueles governantes do PS, mas da "inércia" ou "ineficiência" do Estado.
Segundo o MP, que acusa sete arguidos de dezenas de crimes, Pizarro e Ramos são duas das pessoas que, "num momento inicial da investigação, foram suspeitas de atividade criminal". Porém, e apesar das referidas interceções telefónicas, nem chegaram a ser arguidos.
Apenso "Confidencial"
Ministério Público arquivou suspeitas sobre antigos governantes mas mandou guardar escutas
Ainda assim, a procuradora da chamada "Operação O Negativo", Ana Paula Vitorino, optou por proferir despacho de arquivamento quanto àqueles dois antigos governantes "para que sobre a sua atuação não restem dúvidas". Só que, ao mesmo tempo, mandou guardar em apenso "confidencial" as transcrições das escutas, impedindo a sua publicidade.
O inquérito centrou-se nas razões de a Octapharma ter alcançado, no início do século, uma posição dominante ou de monopólio no fornecimento de derivados e plasma. Tais suspeitas estavam associadas a sucessivas renovações dos efeitos de um concurso público do ano 2000 ganho pela Octapharma, tanto mais que, ao longo da última década, seriam realizados outros concursos, sem que chegassem a produzir efeitos.
Mas o MP concluiu, agora, que não se demonstrou que Pizarro e Ramos tenham atuado com o objetivo de manter a vigência do contrato de 2000. "A situação, a nosso ver, antes se resume à incapacidade do Estado de gerir as dificuldades suscitadas nos concursos pelos concorrentes", concluiu, sobre Ramos.
A conclusão - expressa também em termos de "inércia" e "ineficiência" do "Estado Administração" - é igual para Pizarro. No caso do atual eurodeputado do PS, porém, é precedida de um parágrafo, aparentemente contraditório, em que o MP sugere que Pizarro podia e devia ter usado dos seus poderes para promover a extinção dos efeitos do concurso de 2000 e a anulação de um outro de 2008/09.
"Durante o seu mandato como secretário de Estado, decorreu o concurso público de 2008, que não foi adjudicado, por, entretanto, [Pizarro] ter emitido o despacho n.o º 28356/2008, de 13/10, com o qual autorizou a aquisição descentralizada de produtos derivados do plasma, sem, no entanto, emitir despacho ou dar origem a procedimento que levasse à anulação do CP 2008/09 ou à extinção da vigência do CP9/2000", escreve o MP.
Diretor do "Polígrafo"
Jornalista afirma que não recebeu nada de Lalanda
O diretor do jornal "Polígrafo", Fernando Esteves, acumulou com as suas antigas funções de editor da revista "Sábado" uma quota na empresa de comunicação Alter Ego, contratada para ajudar Lalanda e Castro perante noticias adversas. Tal acumulação, referida no processo e avançada pela própria "Sábado", gerou reações de Esteves e do seu sócio na Alter Ego, Pedro Coelho dos Santos, também ex-assessor do INEM. Este contou que, quando a Alter Ego já estava inativa, pediu a Esteves para a utilizar "para emitir faturas". E Esteves aceitou, sem saber quem eram os clientes de Santos, garantiu este. Esteves reiterou a explicação e lembrou que, na "Sábado", escreveu sobre "Como Lalanda e Castro construiu a teia de influência", num perfil negativo sobre o representante da Octapharma, além de dois livros sobre o processo Marquês, também negativo para o mesmo indivíduo. Esteves reconheceu só que "não foi boa ideia ter permanecido como sócio numa empresa cuja atividade diária desconhecia".
Reação
Pizarro defende-se
"Emiti o despacho n.oº 28356/2008, de 13/10, no âmbito da tutela que me estava atribuída sobre o Instituto Português do Sangue. Quanto aos procedimentos concursais de aquisição, nunca tive qualquer tutela sobre os mesmos", reagiu Manuel Pizarro, questionado pelo JN.
Opção do MP
Sobre a opção do MP de proferir despacho sobre si, disse que é "tão defensável como a contrária". De Francisco Ramos, não foi possível obter reação.