Queda de muro em Mafra divide juízes, mas maioria conclui que reação da vítima foi “natural” perante movimento hostil do animal da raça pastor-alemão.
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Uma mulher vai ser indemnizada em mais de 11 mil euros por ter sofrido ferimentos numa queda de três metros de um muro quando fugia de um cão. A sentença não foi consensual, pois um dos juízes entendeu que a ofendida tinha outras opções de fuga e que as lesões não foram causadas diretamente pelo animal.
O caso remonta a 28 de julho de 2021. O dono de duas cadelas, uma de raça pastor-alemão, com 43 quilos, e outra cruzada, com 23, não estava em casa, na Venda do Pinheiro, Mafra. E a sua mãe foi alimentar os animais, pelas 8.10 horas, mas ao entrar deixou o portão apenas encostado.
Na rua, um casal fazia uma caminhada matinal, quando a cadela de raça pastor-alemão saiu pelo portão mal fechado e correu na sua direção, ladrando de forma agressiva. A mulher entrou em pânico e tentou esconder-se junto a um poste de eletricidade. Depois, por achar que não era suficiente, começou a subir o poste e pôs o pé direito em cima de um muro. Nesse movimento, desequilibrou-se e caiu, de uma altura de três metros, para um terreno.
Vítima operada duas vezes
A mulher não se conseguia levantar e ligaram para o 112. Os Bombeiros Voluntários da Malveira levaram-na de urgência para o Hospital Beatriz Ângelo, em Loures. Uma fratura no pilão da tíbia esquerda exigiu duas cirurgias, em agosto de 2021 e em julho de 2023. A mulher precisou de usar calçado especial e fazer fisioterapia e hidroginástica. Mas ficou com a mobilidade limitada, cicatrizes e dor crónica. Passou a ter pesadelos e, profissionalmente, deixou um cargo de diretora técnica, por incapacidade física e psicológica. Perdeu rendimentos.
Em ação intentada em tribunal contra o dono dos animais e a mãe, a mulher reclamou quase sete mil euros por danos patrimoniais e não patrimoniais. Os réus declinaram responsabilidade, alegaram que o animal não atacou a mulher. A sua queda resultou, unicamente, da reação que teve ao ver a cadela, defenderam.
O tribunal de primeira instância julgou a ação parcialmente procedente e condenou a ré a pagar 11 180 euros, mais os montantes relativos à perda salarial, entre fevereiro e junho de 2022, a apurar em sede de execução da sentença. Ao proprietário dos animais, absolveu-o.
A ré recorreu. Alegou que o cão não mordeu a ofendida, não ladrou e nunca se aproximou dela a menos de cinco metros. Disse que a vítima tinha fobia a cães, o que esta admitiu e foi confirmado por testemunhas, e que a queda ocorreu exclusivamente devido ao medo desproporcional da mulher. Argumentou ainda que o companheiro da autora permaneceu no local e não foi mordido, provando que havia alternativas seguras, e que a mulher até podia ter fugido pela estrada, ou subido a uma viatura próxima.
Deixou de usar saias
Devido às cicatrizes com que ficou, a ofendida evita andar com a perna esquerda descoberta, tendo deixado de usar saias e calções ou de calçar saltos altos, chinelos ou havaianas. Deixou de acompanhar as filhas a parques, jardins, viagens ou passeios, como antes fazia. A sua filha mais velha passou a ter medo de cães.
Animais de guarda
Os pastores-alemães são conhecidos como cães de guarda, sendo utilizados por polícias e militares. Mas é uma das raças mais populares no Mundo, também pela sua versatilidade. Em corrida, atingem os 27 km/h.