
Julgamento da Operação Marquês prossegue com a audição de testemunhas
Foto: Mário Vasa
A mulher de um ex-ministro de José Sócrates garantiu em tribunal que, ao contrário do defendido pela acusação, um contrato de trabalho celebrado com uma empresa de um alegado testa-de-ferro do antigo primeiro-ministro foi real.
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No julgamento do processo Operação Marquês, em Lisboa, Ana Bessa, engenheira agrónoma e mulher de Pedro Silva Pereira, assegurou que em 2013 e 2014 prestou serviços de consultadoria a uma empresa de Carlos Santos Silva por uma avença de cinco mil euros mensais sobre oportunidades de investimento no mercado africano.
Lembrando que à data tinha "17 anos de atividade nos trópicos", a especialista na área do ambiente e energia admitiu que não produziu qualquer trabalho escrito, mas ressalvou que partilhava verbalmente a avaliação da informação que obtinha de diversas fontes com Carlos Santos Silva, em reuniões de uma empresa deste em Lisboa.
"O trabalho era feito", afirmou, acrescentando que não chegou a partilhar um relatório com o empresário porque este foi, em novembro de 2014, detido, por suspeita de ser um dos testas-de-ferro usados pelo antigo primeiro-ministro José Sócrates (2005-2011) para receber dinheiro com origem em corrupção.
Para o Ministério Público, o contrato de trabalho foi falsificado e um expediente para José Sócrates pagar despesas da esfera de Pedro Silva Pereira, ministro da Presidência nos dois governos do socialista e, durante anos, seu amigo próximo.
Entre estas despesas, terá estado também, na tese da acusação, o alojamento, em 2013, de um filho do casal em Paris quando o jovem realizou um estágio na capital francesa.
Esta quarta-feira, Ana Bessa contou que, na altura, ficou surpreendida de o alojamento ser num aparthotel e não na casa da ex-mulher e de um dos filhos de José Sócrates, com um preço quase 15 mil euros. Questionada sobre se sabe quem pagou este valor, a engenheira agrónoma respondeu que não.
No início do depoimento, ao ser-lhe perguntado se mantém atualmente a amizade com José Sócrates, Ana Bessa frisou que esta terminou quando começou a Operação Marquês, pela "perda de confiança" no amigo que o processo originou e por ter acabado por se ver envolvida no caso.
Pedro Silva Pereira, que chegou a ser considerado o braço-direito do antigo primeiro-ministro, também rompeu a amizade, revelou a mulher do ex-ministro.
José Sócrates, de 68 anos, está pronunciado (acusado após instrução) de 22 crimes, incluindo três de corrupção, por ter, alegadamente, recebido dinheiro para beneficiar em dossiês distintos o grupo Lena, ao qual Carlos Santos Silva esteve ligado, o Grupo Espírito Santo (GES) e o 'resort' algarvio de Vale do Lobo.
No total, o processo conta com 21 arguidos, que têm, em geral, negado a prática dos 117 crimes económico-financeiros que globalmente lhes são imputados.
Carlos Santos Silva, de 68 anos, é também um destes arguidos e responde por 23 crimes, enquanto Pedro Silva Pereira e Ana Bessa não foram acusados de qualquer ilícito.
O julgamento decorre desde 03 de julho no Tribunal Central Criminal de Lisboa e tem sessões agendadas pelo menos até 18 de dezembro de 2025.
