Diretiva europeia que obriga entidades com mais de 50 trabalhadores a terem forma de participar suspeitas de corrupção ainda é pouco conhecida.
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Com a entrada em vigor da Lei n.o 93/2021, a 18 de junho, alguns municípios têm recorrido ao privado para criarem o seu canal de denúncias. É o caso do Porto, que celebrou um contrato de um ano, por 12 mil euros, com a empresa Informa D&B, para que esta operacionalize a plataforma de denúncias do município. Além da Autarquia gerida por Rui Moreira, também os municípios da Trofa, Cuba, a Comunidade Intermunicipal das Terras de Trás-os-Montes, alguns reguladores do Estado e empresas têm recorrido a privados para criar esta ferramenta, apurou o JN.
Desde 18 de junho que todas as empresas com mais de 50 trabalhadores estão obrigadas a criar um canal de denúncias para reportar comportamentos ou práticas que possam ser ilegais. Esta lei decorre de uma diretiva da União Europeia, de dezembro de 2019, e insere-se nos esforços para combater a corrupção.
O município da Trofa tem um contrato de cerca de três anos, no valor de 4800 euros, também com a Informa D&B, e a Comunidade Intermunicipal das Terras de Trás-os-Montes celebrou um contrato de 15 mil euros para a Wire Maze implementar a plataforma de denúncias. Já a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões fechou um contrato de 62 dias, no valor de 19 800 euros com a PWC, segundo o portal dos contratos públicos.
empresas surpreendidas
Os orçamentos destes serviços variam consoante a quantidade de trabalhadores da organização e as opções contratualizadas, como aulas e documentos pedagógicos para ensinar os colaboradores a usarem a ferramenta, explicou ao JN Daniel Dabés, fundador da WhistleOn, empresa que gere o canal de denúncias do município de Cuba.
Embora a diretiva europeia esteja a impulsionar o mercado de empresas especializadas neste serviço - como é o caso da WhistleOn, que chegou a Portugal em abril -, há empresas com mais anos de atividade, como a PWC, que "há cerca de nove anos" implementa canais de denúncias em alguns clientes, contaram Gonçalo Almeida e Carolina Costa, da área de serviços forenses da PWC. Ao JN, os dois responsáveis dão conta que "grande parte das entidades foram apanhadas de surpresa" e não percebem como e/ou porque é que precisam de um canal de denúncias.
As empresas que estão no mercado admitem que é necessário um processo educacional para transmitir às empresas as vantagens de adotar o canal (além de ser uma obrigação legal), mas, acima de tudo, ensinar os colaboradores a usar a ferramenta e saberem que a têm à disposição. Daniel Dabés realça que, sem divulgação, o canal não tem sucesso. Tanto a PWC como a WhistleOn elaboram manuais de procedimentos dirigidos aos trabalhadores.
proteção do denunciante
A lei que Portugal transpôs "coloca acima de todos os requisitos a proteção do denunciante e a comunicação por meio de sistemas internos de denúncia que sejam confidenciais e anónimos, de modo que os denunciantes se sintam sempre protegidos", explica a Informa D&B num documento a que o JN teve acesso. O instrumento normativo tem uma especial preocupação com o princípio da não retaliação e do anonimato, reforça Daniel Dabés.
Mecanismo Anticorrupção só estará a 100% em 2023
A 9 de dezembro de 2021 foi criado o Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC), uma entidade administrativa independente que atua no domínio da prevenção da corrupção e vai fiscalizar a adoção dos canais de denúncia. O MENAC insere-se na Estratégia Nacional de Combate à Corrupção 2020-2024, já tem presidente, mas só estará completamente constituído em 2023, apurou o JN junto do Ministério da Justiça. A entidade presidida pelo magistrado jubilado António Pires Henriques da Graça, nomeado pelo Governo, constitui uma prioridade e deveria ser implementada ainda este ano, segundo a ministra da Justiça. Bruxelas já recomendou a Portugal uma rápida operacionalização do mecanismo, que tem por missão a promoção da transparência e da integridade na ação pública e a garantia de políticas de prevenção da corrupção e de infrações conexas.
Coimas de 250 mil €
A não implementação da plataforma de denúncias prevê coimas que podem chegar aos 250 mil euros. As contraordenações muito graves são punidas com coimas entre os mil e os 250 mil euros, e as graves entre os 500 e 125 mil euros. Segundo a lei, constitui contraordenação muito grave impedir a apresentação ou o seguimento de denúncia, praticar atos retaliatórios, não cumprir o dever de confidencialidade e comunicar ou divulgar publicamente informações falsas.
Passo importante
Gonçalo Almeida, da PWC, considera que esta é uma "ferramenta bastante importante para identificar elementos de corrupção, suborno, fraude e outro tipo de criminalidade económica", uma visão partilhada por Daniel Dabés.