Análise de documentação apreendida na operação "Fora de Jogo" aumenta montante das transações suspeitas de fuga ao Fisco e branqueamento de capitais.
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O montante dos negócios no futebol português que estão a ser investigados pelo Fisco é astronómico. São já cerca de 500 milhões de euros em transferências, que envolvem tanto clubes nacionais como estrangeiros. A análise da documentação apreendida aquando da operação "Fora de Jogo" permitiu aos inspetores tributários mais do que duplicar a extensão da investigação, que, em março, abarcava transações avaliadas em cerca de 200 milhões de euros.
Segundo as informações recolhidas pelo JN, os inspetores da Direção de Serviços de Investigação da Fraude e de Ações Especiais da Autoridade Tributária (DSIFAE/AT) têm o objetivo de passar a pente fino todos os negócios, sem exceção, realizados por 14 agentes e intermediários. Um deles, considerado um dos principais arguidos do caso e aquele que mais dinheiro movimenta, é o patrão da empresa Gestifute, Jorge Mendes.
Há dez meses, quando foram realizadas 76 buscas, cinco delas visaram escritórios de advogados que auxiliavam juridicamente os intermediários na elaboração dos contratos tidos como suspeitos. E todas as transferências em que estes juristas prestaram serviços são também alvo do minucioso escrutínio dos inspetores. "Tudo o que envolve os agentes e os advogados visados na operação é para analisar e, por isso, o volume de negócios suspeitos aumentou drasticamente", confiou, ao JN, fonte da AT. Osório de Castro, advogado de Jorge Mendes, foi um dos alvos das buscas na operação.
Presidentes sem telemóveis
Recorde-se que, em março, as suspeitas recaíam sobre transferências que envolviam 49 futebolistas, mas este número também terá aumentado, graças à análise feita, ao longo dos últimos meses, à documentação apreendida.
"As investigações seguirão o seu curso, com a subsequente análise do grande volume de elementos probatórios apreendidos, tendo em vista o apuramento da responsabilidade criminal e vantagens patrimoniais efetivamente obtidas pelos diversos(as) suspeitos(as)", adiantava em março, fonte oficial da AT. Na altura, havia suspeitas de que o Estado tivesse sido lesado em cerca de 40 milhões de euros. Um valor que também aumentou.
É uma investigação sem precedentes ao universo do futebol em Portugal, com buscas às SAD do Benfica, F.C. Porto e Sporting, além de Sporting de Braga, Vitória de Guimarães, Portimonense, Estoril e Marítimo. Também as casas dos dirigentes Luís Filipe Vieira, Pinto da Costa e Frederico Varandas, entre outros, foram alvo de buscas. E os respetivos telemóveis e computadores pessoais foram apreendidos, apurou ainda o JN. Mas todos os emblemas visados garantiram não ter cometido qualquer ilegalidade.
Também as residências de alguns jogadores foram alvo de buscas. Iker Casillas, por exemplo, reagiu nas redes sociais, à presença das autoridades na sua casa: "Coloquei-me à sua disposição [das autoridades]. Transparência é um dos meus princípios".
Na investigação "Fora de Jogo", estão em causa duas dezenas de inquéritos, que são dirigidos pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal e visam, sobretudo, crimes de fraude fiscal e branqueamento de capitais.
Serviços fictícios empolam custos e baixam IRC
Na mira das autoridades estão alegados esquemas de comissões-fantasma milionárias que foram pagas por clubes de futebol, através da emissão, por terceiros, de faturas de serviços de intermediação fictícios.
A engenharia financeira, que envolve uma encruzilhada de empresas, algumas delas com sede no estrangeiro e em offshores, tinha por objetivo aumentar os custos dos negócios, para diminuir os valores de IVA e IRC devidos em Portugal. Por outro lado, também terá feito "desaparecer" dinheiro, aproveitando as contas bancárias das offshores.
"Os negócios investigados prendem-se com diversas realidades contratuais, tendo visado, nomeadamente, o recebimento de valores, inclusive em matéria de direitos de imagem, neste caso com eventual participação de agentes/intermediários não residentes em território nacional, bem como com a contabilização de faturação não correspondente a negócios reais", adiantou a Autoridade Tributária, para a qual "os mesmos negócios terão visado ocultar ou obstaculizar a identificação dos reais beneficiários finais dos rendimentos, subtraindo-os, por estas vias, ao cumprimento das obrigações declarativas e subsequente tributação".