O psicanalista Carlos Amaral Dias, falecido em dezembro de 2019 e pai da psicóloga Joana Amaral Dias, considerou em 2018, em declarações à Polícia Judiciária (PJ) lidas esta quarta-feira em tribunal, que a única forma de ter sido drogado com calmantes foi de forma "dissimulada", sem incriminar qualquer pessoa.
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O caso não está relacionado com o óbito do professor universitário, aos 73 anos, e, para o Ministério Público, terá sido a viúva a administrar, em várias ocasiões entre 2017 e 2018, os benzodiazepinas em excesso. Susana Quintas está a ser julgada há cerca de um mês, no Tribunal Central Criminal de Lisboa, por ofensa à integridade física grave e nega a acusação.
Esta quarta-feira, médicos próximos do casal contradisseram-se quanto à capacidade que Carlos Amaral Dias, dextro e com o lado direito do corpo paralisado desde que sofrera um acidente vascular cerebral (AVC) em 2012, tinha para, com a mão esquerda, retirar os comprimidos das caixas de medicamentos, que guardaria na mesa-de-cabeceira. Dividiram-se, igualmente, quanto à possibilidade de o psicanalista se ter automedicado.
Em 2018, em declarações à PJ na sequência de um queixa contra desconhecidos apresentada por Joana Amaral Dias, de 48 anos, dois irmãos e Susana Quintas, o professor universitário reconheceu que até novembro de 2017 prescrevera calmantes a si próprio, mas não equacionou a hipótese de ter inadvertidamente ultrapassado a dosagem recomendada.
Em contrapartida, sublinhou que quem o tenha querido drogar só o poderia ter feito de forma "dissimulada". O objetivo, acrescentou, não seria "matá-lo", mas "apenas" deixá-lo "mais prostrado", para que essa pessoa ficasse "mais liberta" do encargo de cuidar de si.
Na altura, Carlos Amaral Dias residia com a mulher e a única filha em comum do casal e tinha como funcionários uma empregada doméstica de segunda-feira a sábado, uma secretária e um motorista. Nenhum, defendeu, ficaria a ganhar com a sua morte.
"Não ia achar que era a minha mãe"
Esta quarta-feira, a então adolescente, atualmente com 20 anos, garantiu que, em 2018, culpou a empregada doméstica pela sobredosagem de benzodiazepinas, detetada aquando de um internamento hospitalar em estado "quase comatoso". "Eu tinha 15 anos. Não ia achar que era o meu pai. Não ia, com 15 anos, achar que era a minha mãe", justificou.
Hoje, admite, atendendo à investigação do Ministério Público, que a culpada tenha sido, afinal, a mãe. "Tenho de ponderar essa opção. Uma investigação de três anos não pode estar totalmente errada", afirmou, argumentando que, com formação académica e profissional que o pai tinha, "se quisesse relaxar e aliviar [a dor], não iria tomar medicamentos voluntariamente para chegar àquele ponto".
Em tribunal, aonde chegou de mão dada com Joana Amaral Dias, escusou-se a interagir com a mãe, que, ao longo do testemunho, aparentou estar bastante perturbada com a situação. "Só quero defender o meu pai", afirmou, mais do que uma vez, a adolescente à data dos factos.
O julgamento prossegue na próxima segunda-feira, 23 de outubro de 2023, com as alegações finais, destinadas à apresentação de conclusões pelo Ministério Público, pela defesa de Susana Quintas, e pela mandatária de Joana Amaral Dias, assistente no processo. Só depois o tribunal agendará uma data para a leitura do acórdão (sentença proferida por um tribunal coletivo e não de um só juiz).
De acordo com o Código Penal, o crime de ofensa à integridade física grave é punível com pena de dois a dez anos de prisão. Joana Amaral Dias exige ainda ser indemnizada.