Quase um milhão de euros apreendidos em esconderijos numa banheira de António Calvete, investigado por branqueamento. Ex-deputado julgado em breve por burlas com contratos.
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O Ministério Público e a Polícia Judiciária apreenderam "barras de ouro e notas do Banco Central Europeu, num valor que ronda os 900 mil euros", que estavam escondidas "nas paredes e no vão de um jacuzzi" do presidente do grupo de colégios privados GPS, António Calvete. Um filho deste antigo deputado do PS também foi alvo da operação de buscas, desencadeada quinta-feira e que incidiu sobre residências e empresas da zona de Pombal e Leiria, por suspeitas de lavagem de dinheiro sujo.
Os investigadores procuram provas de que António Calvete, "em data próxima" da dedução de acusação contra si no inquérito sobre os contratos de associação dos colégios GPS, "deu início a um processo de conversão de dinheiro em ouro", esclareceu ontem o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP). Os factos sob investigação podem integrar, "designadamente, o crime de branqueamento" de capitais, mas o inquérito ainda não tem arguidos constituídos.
Segundo as informações recolhidas pelo JN, as barras de ouro e o numerário referidos estavam numa moradia de António Calvete situada no Louriçal, freguesia do concelho de Pombal onde nasceu o GPS, mas não foram fáceis de encontrar. "Só foram encontrados graças à realização de buscas minuciosas, pois encontravam-se ocultos nas paredes e no vão de um jacuzzi", precisou o DCIAP na sexta-feira.
Conexão de processos
As diligências de busca ordenadas por aquele departamento do Ministério Público acontecem a pouco mais de dois meses da data agendada para o início do julgamento de António Calvete e outros quatro administradores do GPS, por crimes de burla qualificada, falsificação de documentos e peculato. Embora o Tribunal da Relação de Lisboa ainda tenha pendente um recurso que pode alargar o rol de crimes e arguidos (ver caixa), aqueles cinco indivíduos deverão responder, no mínimo, por terem enganado e lesado o Estado, na celebração de contratos de associação e no destino inapropriado que deram a 30 dos 300 milhões de euros que o GPS recebeu, só entre 2005 e 2013, do Ministério da Educação.
No novo processo, para fazer prova de que António Calvete branqueou capitais, o Ministério Público vai ter de demonstrar que o arguido cometeu, previamente, um crime que lhe permitiu obter o dinheiro sujo. Mas este crime precedente não tem de constar do mesmo processo. Ou seja: os crimes do processo que deve seguir para julgamento já no próximo mês de setembro também poderão servir para imputar o de branqueamento de capitais no novo processo em curso.
Este inquérito nasceu de alertas bancários, feitos ao abrigo da lei do branqueamento de capitais, sobre depósitos avultados que António Calvete fez em contas de familiares, que, posteriormente, deram ordens de compra de ouro com aquele dinheiro. Um desses familiares será João Calvete, filho do patrão do GPS e que também foi alvo de buscas. Fonte próxima da defesa do pai alegou, no entanto, que apenas foram apreendidos àquele indivíduo uma agenda e "dois mil e poucos euros".
PROCESSO
Calvete e Canavarro ainda podem responder por corrupção
No caso dos colégios que está a chegar a julgamento, o Ministério Público também acusou António Calvete de corromper o ex-secretário de Estado da Educação José Manuel Canavarro e o ex-diretor regional de Educação de Lisboa José Almeida, do PSD, para obter contratos de associação. Em instrução, o juiz Ivo Rosa não confirmou nenhum crime de corrupção, aguardando-se que, até setembro, a Relação decida o recurso do MP. Na parte confirmada por Ivo Rosa, os arguidos são acusados de gastar verbas destinadas a educar os alunos em despesas, por exemplo, com automóveis desportivos e vinhos caros.
PORMENORES
300 milhões de euros é o montante aproximado de verbas públicas que o Estado pagou, entre 2005 e 2013, ao GPS, que chegou a ter 13 colégios com contratos de associação com o Estado.
Gestores julgados
Cinco administradores do GPS vão ser julgados por burla qualificada, falsificação agravada e peculato: António Calvete, Manuel Madama, Fernando Catarino, António Madama e Agostinho Ribeiro.
Políticos ilibados
Enquanto secretário de Estado da Educação, José Canavarro viabilizou contratos de associação com o GPS, tornando-se, depois, seu consultor. José Almeida, ex-diretor regional de Educação de Lisboa, tornou-se depois supervisor pedagógico do GPS. Foram acusados de corrupção, mas o juiz Ivo Rosa concluiu que nenhum deles merecia ser julgado.