O presidente Ricardo Rodrigues, um vereador e uma ex-vereadora da Câmara de Vila Franca do Campo vão ser julgados por prevaricação e abuso de poder. O Tribunal da Relação de Lisboa reverteu a decisão de não pronúncia do Tribunal de Instrução de Ponta Delgada pelo que os três vão mesmo ter de ir a julgamento.
Corpo do artigo
Em causa está a concessão da exploração de um restaurante a uma associação do irmão do presidente e do marido da ex-vereadora. Recorde-se que, em 2012, Ricardo Rodrigues, então deputado, foi condenado a uma multa de 4950 euros por ter abandonado uma entrevista na Assembleia da República com os gravadores de dois jornalistas.
O caso que agora vai a julgamento remonta a finais de 2017. Segundo a acusação do Ministério Público (MP), Ricardo Rodrigues e os então vereadores Carlos Pimentel e Nélia Guimarães “delinearam um plano” para que a concessão de um espaço de restauração da Rotunda dos Frades fosse “assegurada” a Luís Rodrigues, irmão do presidente.
Luís Rodrigues e o marido da vereadora Nélia Guimarães terão constituído uma associação sem fins lucrativos com a intenção de apresentar uma proposta de concessão, “preparada previamente à abertura do procedimento”. O MP alega que os autarcas terão dado conhecimento antecipado dos procedimentos à associação, retardando o mais possível a informação a outros concorrente.
Só informaram a hora e meia do fim do prazo
A acusação, citada pela Lusa, lembra que chegou a surgir um outro interessado, mas este só obteve os elementos solicitados à Câmara (como a cópia do projeto de arquitetura, pareceres e alvarás) quando faltava “uma hora e meia para o termo do prazo do concurso”, razão pela qual “não apresentou proposta“.
O inquérito, iniciado em 2018, surgiu na sequência de uma participação que o PSD fez junto do MP sobre a concessão daquele espaço junto à rotunda dos Frades “a familiares de membros” da maioria socialista do executivo municipal.
Em agosto de 2022, o MP decidiu acusar Ricardo Rodrigues e os dois vereadores dos crimes de abuso de poder e prevaricação. Ricardo Rodrigues contestou a acusação explicando que o MP omitira alguns factos. "Não vou dizer que intencionalmente, mas omitiu alguns factos para que a sua versão tenha consistência”, apontou.
Foi despronunciado mas MP recorreu
Em setembro de 2022, o ainda presidente de Vila Franca do Campo anunciou que havia pedido a instrução do processo, alegando “falta de fundamento da acusação“. Em outubro de 2023, o Tribunal de Instrução Criminal de Ponta Delgada decidiu não levar os arguidos a julgamento.
O MP recorreu e, em maio, o Tribunal da Relação de Lisboa deu-lhe razão. “O Tribunal da Relação de Lisboa julgou procedente o recurso interposto pelo MP e, em consequência, revogou a decisão recorrida, determinando a sua substituição por outra que pronuncie os arguidos pelos factos constantes da acusação deduzida pelo MP, para julgamento em processo comum com intervenção do tribunal singular”, anunciou na semana passada a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa.
Condenado por atentado à liberdade de imprensa
Enquanto deputado do PS, Ricardo Rodrigues foi protagonista de um caso insólito que, em 2012, lhe valeu uma condenação por atentado à liberdade de imprensa e à liberdade de informação. Durante uma entrevista na Assembleia da República à revista Sábaado, em abril de 2010, quando foi confrontado com um alegado envolvimento num escândalo de pedofilia nos Açores, Ricardo Rodrigues levantou-se e foi-se embora levando consigo os gravadores dos jornalistas. O gesto ficou gravado em vídeo.
Em julgamento, Ricardo Rodrigues explicou que decidira apoderar-se dos gravadores para assim poder provar que os jornalistas estavam a tentar “denegrir a sua imagem pública” e para se defender caso a entrevista fosse publicada de forma deturpada. Apesar de ter devolvido os gravadores, Ricardo Rodrigues acabou condenado a 110 dias de multa a 45 euros diários, num total de 4950 euros. Recorrreu, mas a sentença foi confirmada um ano e meio mais tarde pela Relação de Lisboa.