Um recluso de 39 anos, suspeito de liderar um esquema de tráfico de estupefacientes no Estabelecimento Prisional de Coimbra, admitiu hoje em tribunal que traficava droga impregnada em folhas de papel. Um chefe dos guardas prisionais disse que este fenómeno criminal surgiu ali em 2019.
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Na primeira sessão do julgamento, o homem admitiu que “são verdade” os factos descritos na acusação que apontam para um plano de introdução na prisão de MDMB, um canabinoide sintético, impregnado em folhas de papel A4, para venda a reclusos, para consumo ou revenda.
O processo em julgamento no Tribunal de Coimbra envolve, além deste arguido, mais cinco pessoas, de idades entre 25 e 62 anos: a mulher do recluso, em prisão preventiva, três presos e o pai de um deles.
Em tribunal, o alegado cabecilha, que cumpre (desde 2021) uma pena de oito anos por contrafação de moeda e agora está na cadeia de Paços de Ferreira, afirmou que a droga, que é inalada por combustão, lhe foi apresentada na cadeia, onde começou a consumi-la.
Sobre a mulher, que é suspeita de encomendar a droga através da internet, o marido e arguido disse ao tribunal que lhe tinha dito que a MDMB não era ilegal e “era menos prejudicial que canábis”.
O arguido explicou ainda que as folhas eram partilhadas com outros reclusos, dependendo do dinheiro que era colocado. Os pagamentos eram feitos através de Mbway para a mulher.
Quanto ao número de folhas encomendadas, indicou que variava, assim como a sua periodicidade, que dependia também dos consumos.
As folhas de papel seriam introduzidas na cadeia através de correio ou de visitas, disse o arguido, o único dos seis que prestou declarações. O seu depoimento estava a ser feito através de videoconferência e foi suspenso, por “dificuldade de clareza e nitidez”. Será retomado, já com a presença física do arguido do tribunal, na sessão agendada para dia 16 de junho.
Fenómeno visto em Coimbra desde 2019
Segundo um chefe da guarda prisional do Estabelecimento de Coimbra, foi por volta de 2019 que começou a verificar-se este fenómeno da droga em papel na cadeia. Contou que foram fazendo apreensões, quando desconfiavam, sem certeza de que a folha estava impregnada de droga.
O chefe dos guardas apontou que o alerta foi o caso de um recluso que, devido ao consumo, foi internado, ficando em estado vegetativo.
A testemunha diz que a situação começou a piorar e há casos de agressividade depois do consumo. Aponta que numa primeira fase, eles alucinavam e caíam e, ao virem a si, “parecia que nada se passava”.
Segundo o chefe de guardas prisionais, houve uma fase em que as folhas foram alteradas e já não eram feitas de forma “caseira”. De início, salientou, era possível identificar manchas nas folhas.
A testemunha, apontou ainda que, segundo que era dito pelos reclusos, uma folha de papel valeria entre 3 a 5 mil euros.
Ameaças para introduzir cocaína da cadeia
Na primeira sessão do julgamento, foi ainda ouvido um recluso, também do Estabelecimento Prisional de Coimbra, que denunciou um dos arguidos por lhe ter exigido, em 2023, a introdução de droga na cadeia, após uma saída.
A testemunha diz ter começado a fazer “negócios” com o arguido na cadeia, consumindo cocaína na sua cela sem pagar.
Numa licença de saída da cadeia por vários dias, assinalou, ter-lhe-á sido exigido que trouxesse uma quantidade de cocaína para a prisão. Se não acedesse, teria de pagar uma dívida de 30 mil euros, via transferência bancária, por prestações. A testemunha diz que não pagou nenhuma quantia.
Sobre a droga em folhas de papel, disse que ouvia rumores, mas nunca tinha visto.
