Pedro Silva tem 54 anos, está desde 2007 a cumprir 21 anos e dez meses de cadeia por homicídio e, até recentemente, nunca pensara que couves, espinafres, rúculas ou coentros podem germinar em torres de plástico e não apenas em terrenos plantados.
Corpo do artigo
A perceção mudou quando, em abril passado, montou, com outros reclusos e em parceria com guardas prisionais, a horta vertical do Estabelecimento Prisional (EP) de Torres Novas, no qual estão instalados 42 presos prestes a terminar a sua pena e já com grande parte do dia a a dia passado no exterior.
A iniciativa - pioneira nas prisões nacionais e oficialmente inaugurada esta quarta-feira pela ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro - é o mais recente projeto de uma cadeia cujo objetivo é preparar a reintegração na sociedade de reclusos que cumpriram noutros EP, em regime fechado, pelo menos dez anos da sua pena.
Ao todo, são 40 as torres de cerca de três metros implantadas entre o arame farpado e o pequeno edifício do EP de Torres Novas. A maioria tem já verduras prontas a colher, nutridas com uma mistura orgânica aplicada nas raízes suspensas no ar.
Verduras entregues a famílias vulneráveis
Os alimentos vão ajudar a alimentar cerca de 100 famílias apoiadas por instituições locais, frisou, na apresentação do projeto, Margarida Villas-Boas, da Upfarming, empresa que tem dado formação para a manutenção da horta e para quem os guardas prisionais são "os anjos da guarda" do projeto. Há ainda intenção de usar as verduras nas refeições dos reclusos de Torres Novas, para que estas sejam "um momento mais especial".
"É uma experiência bonita", resumiu esta quarta-feira, ao JN, Pedro Silva, pouco antes de mostrar ao presidente da Câmara Municipal de Torres Novas, Pedro Ferreira, como se apanham os coentros na horta vertical. Os molhos quase não cabem na cesta.
"Num metro quadrado de terra cabem oito plantas. Assim, cabem 52 num metro quadrado", acrescentou, sem esconder que já equaciona, quando ficar em liberdade", ter "uma ou duas torres" na sua própria casa, quem sabe até para "ajudar os vizinhos" que precisem.
A azáfama da inauguração deixou Rosa Maria Duarte, de 60 anos e guarda prisional no EP de Torres Novas, com um brilho no olhar. Há 15 anos, recordou, era comum formar equipa com outros colegas para que os presos fossem trabalhar no exterior. Agora, já nenhum necessita de ser escoltado. "Estou muito feliz. O trabalho está a ser compensatório", disse, sorridente.
Já a ministra da Justiça assegurou que "espera poder ver este e outros projetos replicados" noutros EP. A inauguração contou ainda com a presença do diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais. "Não há santos sem passado, nem pecadores sem futuro. É disso que estamos aqui a falar: do futuro destes pecadores", concluiu Rui Abrunhosa Gonçalves.