O Supremo Tribunal de Justiça confirmou o despedimento de um professor de um colégio de Braga que entrava no balneário feminino no final das aulas de Educação Física, quando as alunas se estavam a preparar para as aulas seguintes.
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Por acórdão de 15 de outubro, hoje consultado pela Lusa, o STJ sublinha que o professor teve aquele comportamento por quatro vezes, quando os balneários estavam a ser utilizados por alunas dos 6.º e 8.º anos de escolaridade, com idades compreendidas entre os 11 e os 14 anos.
Acrescenta que as alunas estavam a preparar-se para as aulas seguintes, "num momento em que era expectável que estivessem a refrescar-se ou a mudar de roupa, o que o professor não podia ignorar".
"As alunas encontravam-se na fase da puberdade, a qual é caracterizada, como é do conhecimento geral, por desenvolvimento e mutações físicas, psicológicas e emocionais geralmente associadas a particular fragilidade, bem como a acrescida suscetibilidade e melindre quanto ao seu corpo, especialmente no caso das raparigas, sendo por isso fundamental preservar os espaços de intimidade dos (pré)adolescentes, mormente em contexto escolar, realidade que o professor não podia ignorar nem subestimar", refere o acórdão.
O Supremo vinca que se trata de uma fase de desenvolvimento psicológico e físico em que as experiências são "particularmente relevantes e marcantes, pelo que as crianças devem ser resguardadas de qualquer tipo de comportamento invasivo da sua privacidade por parte de adultos, até para que possam crescer interiorizando a ideia de que isso não pode ser tolerado sem motivo justificado ou de força maior, sobretudo quando, estando em causa meninas, se trata de um homem, professor, investido na inerente posição pedagógica e de autoridade".
Mãe de jovem reclamou
O STJ lembra ainda que dois dos episódios ocorreram depois de o professor, que já tinha antecedentes disciplinares, ter sido informado da reclamação de uma mãe, uma persistência que "agrava a censurabilidade do conjunto da sua conduta".
O professor alegou que a sua intenção era apressar as alunas a sair, no âmbito do plano de contingência aprovado pelo colégio para evitar contágios, em decorrência da pandemia de covid-19.
Disse ainda que batia à porta do balneário e a abria apenas um pouco, ou que chamava pelas alunas e que, perante a falta de resposta delas, entrava e ficava junto à zona dos lavatórios a chamá-las.
Mas o tribunal refere não vislumbrar qualquer justificação plausível para a sua conduta. "Não se alcança a razão pela qual as queria apressar, desde logo porque os factos em causa tiveram lugar após a sua aula. Se o objetivo era esse, exigia-se que o professor tivesse solicitado a colaboração de alguma funcionária ou docente do género feminino ou que se tivesse limitado a bater à porta ou a chamar as alunas em voz alta", considera o STJ.
Os juízes sublinham que a educação é uma responsabilidade fundamental do Estado, estando os estabelecimentos de ensino obrigados a acautelar que as crianças e jovens aprendem num lugar seguro, com respeito pelos seus direitos, dignidade e desenvolvimento físico e psíquico.
"Face à importância da função social desenvolvida, exige-se aos professores um comportamento de especial elevação, com respeito pelos direitos dos alunos, na prossecução dos múltiplos interesses públicos envolvidos neste âmbito. A escolha de um estabelecimento de ensino pelos pais, sobretudo tratando-se de uma escola privada, assenta na confiança que nele depositam, sendo inquestionável que o comportamento de um professor do tipo do apurado nos autos é suscetível de colocar seriamente em causa a confiança dos progenitores na escola", lê-se ainda no acórdão.
O professor tinha sido despedido na sequência de um procedimento disciplinar e recorreu para tribunal. A primeira instância deu razão ao colégio, a Relação condenou o estabelecimento de ensino a reintegrar o professor e agora o STJ ditou a justa causa do despedimento.