Eram 22 horas de 21 de novembro de 2014 quando, ao aterrar no Aeroporto de Lisboa, o ex-primeiro-ministro José Sócrates foi detido por suspeitas de "corrupção, fraude fiscal, branqueamento de capitais e falsificação de documentos".
Corpo do artigo
O horário tardio, perto da hora de fecho diária do "Jornal de Notícias", remeteu o assunto para uma única notícia na última página, sem que esta deixasse, acompanhada de uma fotografia do socialista, de ser manchete no dia seguinte: "Detido", na edição Norte; "José Sócrates detido em processo de fraude fiscal", na edição Sul.
O artigo identificava mais três arguidos detidos: "o empresário Carlos Santos Silva (administrador do Grupo Lena e amigo de Sócrates), Gonçalo Ferreira (advogado que trabalha numa empresa de Carlos Santos Silva) e Joaquim de Castro (representante em Portugal da Octapharma, a farmacêutica para a qual Sócrates trabalhava desde 2013, como consultor para a América Latina)". O contrato cessaria dias depois, mas a 23 de novembro a notícia era outra.
"Banco do Estado denuncia Sócrates", titulou então o JN na capa, a Norte e a Sul, tendo como fundo uma fotografia a quase toda a página do ex-primeiro-ministro a chegar de carro, já após ter passado uma noite na cadeia, "ao Tribunal de Instrução Criminal, em Lisboa".
"Foram várias transferências fracionadas de Adelaide Carvalho Monteiro para uma conta do filho, num período em que este se mantinha em Paris, a estudar Filosofia, que despertaram alarmes nos funcionários do banco público", começava a notícia na página dois, a primeira de seis dedicadas ao tema, além do editorial.
Prenúncio dos anos seguintes
Os títulos eram já um prenúncio do que seriam os anos seguintes da Operação Marquês: "Amigo suspeito de ser testa de ferro" e "Questionada legalidade da detenção de Sócrates", lia-se nas páginas 4 e 5, antes de, na 6, surgirem frente a frente os perfis do ex-líder do PS - "Percurso de casos, boatos e inimigos" - e de Carlos Alexandre - "um superjuiz pronto para beber a cicuta".
A 24 de novembro, no mesmo dia em que a manchete do JN referiu que a investigação procurava "provas de corrupção", o magistrado colocou José Sócrates em prisão preventiva. A medida de coação mereceu nova manchete a 25: "Preso até um ano à espera de acusação." A "fortuna de 20 milhões de euros" e "o manto de silêncio entre socialistas" foram outros dos temas abordados em quatro páginas.
O caso originou um megaprocesso e, até agora, nenhum dos detidos a 21 de novembro de 2014 foi julgado. José Sócrates continua a dizer-se inocente.