Relação de Lisboa condenou o Estado a indemnizar suspeita de branqueamento de capitais que acabaria por ser absolvida do crime.
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A dona de um Mercedes vai receber 35.250 euros de indemnização do Estado, mais juros, por ter sido privada da sua viatura durante 18 anos, decidiu, este mês, o Tribunal da Relação de Lisboa. O automóvel foi apreendido em 2004, à ordem de um processo em que a proprietária era suspeita de branqueamento de capitais. Porém, dez anos depois, a mulher foi absolvida do crime.
O tribunal que absolveu a arguida também decidiu que o Mercedes lhe deveria ser devolvido. Mas a apreensão só seria declarada extinta no final de 2017. Depois disso, o Estado demorou ano e meio a apurar o valor da compensação definida por lei; e só em maio de 2019 é que a Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública fixou a compensação em 15.468 euros. Um valor que a proprietária rejeitou, por considerá-lo "inferior ao prejuízo sofrido com a desvalorização da viatura", e que a levou a avançar para tribunal. O veículo só foi devolvido em maio de 2022. Durante quase duas décadas, esteve nas mãos da Polícia Judiciária, que fez com ele mais de 300 mil quilómetros.
A proprietária, por seu lado, "teve de recorrer a meios alternativos, o que lhe causou o prejuízo decorrente dos gastos que teve de suportar para esse efeito". Na ação que intentou contra o Estado, pediu uma indemnização de 62 500 euros (mais juros): 42.500 pela desvalorização da viatura e 20 mil euros "tendo em conta a utilização efetuada (...) e a necessidade que a requerente dela tinha para o seu transporte".
Em primeira instância, o tribunal condenou o Estado a pagar 35.250 euros, mas a mulher recorreu, alegando que este valor não atendia à "depreciação monetária" e que os juízes não se pronunciaram sobre o pagamento de juros. No entanto, a Relação de Lisboa manteve o valor fixado em 1.ª instância. "Verifica-se que o montante indemnizatório foi fixado com recurso a um juízo de equidade, o qual teve apoio referencial nos valores trazidos aos autos em sede de perícia. Afigura-se justa e adequada a indemnização fixada, considerando que nesse valor se contém a apreciação das oscilações do valor da moeda", lê-se no acórdão, de 9 de fevereiro, dos juízes desembargadores Ana Paula Olivença, Rui Manuel Oliveira e Teresa Prazeres Pais.
Ainda assim, o Estado português foi condenado a pagar juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, "desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento sobre a quantia objeto da condenação".
Custou quase 73 mil euros
Para apurar o valor indemnizatório, os juízes atenderam aos valores da viatura à data da apreensão (cerca de 38 mil euros) e da devolução (2750 euros).
A viatura foi adquirida em 2001, por 72 820 euros. Quando foi apreendida, em 2004, marcava 68 385 quilómetros. Foi devolvida, em 2022, com quase 400 mil. Enquanto esteve nas mãos da PJ, o Estado gastou 9098 euros em reparações e manutenção.