Salgado disse a Pinho que ajudar Sócrates na campanha eleitoral seria "uma palermice"
O ex-ministro Manuel Pinho (2005-2009) afirmou esta sexta-feira, em tribunal, que Ricardo Salgado, então presidente do BES, lhe disse que seria "uma palermice" ajudar José Sócrates na campanha eleitoral para as Legislativas de 2005.
Corpo do artigo
José Sócrates acabaria mesmo por conseguir formar Governo, tendo Manuel Pinho, então quadro superior do BES desde 1994, assumido a pasta da Economia. Agora, o ex-ministro está a ser julgado, em Lisboa, com o ex-banqueiro, por, enquanto exerceu funções governamentais, ter alegadamente beneficiado indevidamente os interesses do Banco Espírito Santo (BES) e do Grupo Espírito Santo (GES), a troco de cerca de cinco milhões de euros.
Em causa estão crimes de corrupção, fraude fiscal e branqueamento. A mulher de Manuel Pinho, Alexandra Pinho, está igualmente acusada. Os arguidos negam as acusações. Já o antigo primeiro-ministro nunca foi suspeito neste processo.
"O Dr. Salgado nem por sombras encorajava quadros do banco a terem atividade políticas", afirmou esta sexta-feira, no segundo dia do seu depoimento no julgamento, Manuel Pinho, sublinhando que o ex-banqueiro não gostou quando o informou de que iria ajudar José Sócrates na campanha eleitoral de 2005. "Disse-me: 'Isso é uma palermice, não se meta nisso", assegurou o antigo governante.
"Maior erro de toda a minha vida"
Em tribunal, o ex-ministro, de 68 anos, mostrou-se, de resto, arrependido de ter aceitado o convite para tutelar a área da Economia no Governo. "Provavelmente, foi o maior erro de toda a minha vida, que deu origem a todos estes problemas e me fez perder uma fortuna colossal", desabafou Manuel Pinho.
Tal como na primeira sessão do julgamento, o antigo governante insistiu que perdeu dinheiro ao assumir funções ministeriais. E reiterou que o montante que recebeu da esfera do BES entre 2005 e 2012, incluindo quando esteve no Governo, se tratou de "uma dívida" decorrente do contrato que tinha assinado em 2004 quando fora afastados pelos "acionistas" do banco da coordenação da área de mercado de capitais.
"O Ministério Público está a confundir alhos e bugalhos no que diz respeito às supostas vantagens indevidas", defendeu Manuel Pinho. Em causa, alegou, está o facto de, no montante global das alegadas "luvas", estar, por exemplo, o salário pago à sua mulher como curadora da coleção BES Photo Art. "É uma atitude machista totalmente inadmissível. A minha mulher não subiu na horizontal", reafirmou.
O antigo governante insistiu igualmente que parte dos montantes em causa, que considera legítimos, foi paga através de offshores por decisão de Ricardo Salgado e que até chegou a pedir para que não fosse assim. "Na prática, era impossível controlar os pagamentos", justificou.
Questionado pelo tribunal sobre como, sendo uma "imposição", o ex-banqueiro sabia qual era a sociedade offshore detida por Manuel Pinho para a qual deveria transferir o dinheiro, o arguido remeteu explicações para mais tarde. O depoimento prossegue na próxima terça-feira, 17 de outubro de 2023, no Tribunal Central Criminal de Lisboa.