Uma antiga secretária pessoal de João Neves, anterior secretário de Estado da Economia, demitido há uma semana por António Costa, foi acusada pelo Ministério Público (MP) de quatro crimes de corrupção passiva.
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Teresa Saraiva é suspeita de receber estadias em hotéis e queijos da serra em troca de favores a Gumercindo Lourenço, dono de várias empresas dos ramos da hotelaria, termas e construção civil, que nos últimos anos tem estado na mira da justiça. O empresário de Viseu está indiciado por quatro crimes de corrupção ativa.
Segundo a acusação, "pelo menos desde o início do ano de 2014, o arguido Gumercindo Lourenço ofereceu e deu, efetivamente, à arguida Teresa Saraiva e a terceiros, por indicação daquela, vantagens patrimoniais e não patrimoniais, como forma de retribuir a sua atuação, enquanto secretária pessoal do Ministro da Economia e, a partir de 2018, enquanto secretária pessoal no gabinete do secretário de Estado da Economia, nomeadamente, através da aceleração, simplificação e agilização dos procedimentos, e, dessa forma, interferindo e influenciando a tomada de decisões, não só no Ministério da Economia, mas também noutras entidades, como o Instituto do Turismo de Portugal e a Direção-Geral de Energia e Geologia".
O MP sustenta que embora Teresa Saraiva não tivesse "poderes decisórios, tinha a capacidade de interferir e influenciar a tomada de decisões de procedimentos administrativos relacionados com o grupo empresarial liderado pelo arguido Gumercindo Lourenço", que entre os anos de 2014 e 2019 concorreu à concessão de quatro estâncias termais na região Centro (Penamacor, Fornos de Algodres, Soure e Aguiar da Beira).
A investigação, a cargo da Polícia Judiciária de Coimbra, apanhou várias mensagens trocadas entre os arguidos. Nos SMS, enviados ao longo de cinco anos, Gumercindo Lourenço e Teresa Saraiva combinavam favores, trocavam informações e datas de reuniões com governantes e dirigentes de organismos públicos.
Como "brinde", a arguida e a família receberam pelo menos quatro estadias, com tudo incluído, em hotéis de Gumercindo Lourenço. Nos anos de 2014, 2015, 2017 e 2019, Teresa Saraiva, o marido e a filha ficaram hospedados vários dias sem pagar. Só em 2015, a conta do hotel custou mais de 1700 euros.
A arguida recebeu ainda pelo menos cinco vezes, entre 2015 e 2017, queijos da serra que distribuiu por si e por terceiros, revela a acusação.
A investigação esteve a cargo da Polícia Judiciária de Coimbra. A acusação solicita a perda de vantagens obtidas com o crime.
Teresa Saraiva foi exonerada, a seu pedido, a 21 de novembro do cargo de técnica especialista que ocupa na Secretaria de Estado da Economia desde março deste ano. Saiu cerca de um mês depois de ser conhecida a acusação do Ministério Público do Departamento de Investigação Criminal de Coimbra. Entre outubro de 2018 e outubro de 2019 foi secretária pessoal de João Neves. A arguida passou, desde 1981, por vários governos, sempre no Ministério da Economia.
Gumercindo Lourenço já foi condenado a quatro anos de cadeia com pena suspensa, por obtenção ilícita de subsídio para construção de um hotel.
Noutro caso, relacionado com a construção de uma estrada em Tabuaço, é acusado de corrupção ativa de titular de cargo político agravado, prevaricação de titular de cargo político, falsificação de documento e fraude na obtenção de subsídio, juntamente com o anterior presidente da Câmara local, João Ribeiro.
O empresário é ainda suspeito de ter corrompido um juiz a troco de informações sobre processos.
Contactado pelo JN, o advogado de Gumercindo Lourenço, disse que o seu cliente entende que "a acusação não tem qualquer fundamento" e que tudo vai ser explicado "em sede própria".