Em nove meses, Segurança Social encerrou 90 estruturas sem licença. Ministério Público recebeu 39 participações pelo crime de desobediência.
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A pandemia da covid-19 revelou quase 600 lares de idosos ilegais. Noventa deles foram mesmo encerrados entre março e novembro, 23 dos quais com caráter de urgência e com a retirada imediata dos utentes. Em nove meses, a Segurança Social também participou ao Ministério Público 39 crimes de desobediência, por ter identificado estruturas que, apesar da ordem para fechar, continuavam de porta aberta.
Anteontem, dez utentes e três funcionárias de um lar ilegal no Freixo, concelho de Almeida, acusaram positivo à covid-19, após ter sido detetado um surto. Os doentes permanecerão naquele espaço até ficarem curados, mas o JN apurou que, a seguir, serão acionados os meios legais para encerrar o lar. Este não tem licenciamento, nem condições para albergar os 12 idosos que ali permaneciam.
Este foi o último caso sinalizado desde o início da pandemia. Dados enviados pela Segurança Social ao JN revelam que, entre março e novembro deste ano, "foram concluídos processos de fiscalização a 381 lares de idosos ilegais e encontram-se em curso processos noutros 184".
Para já, e tendo em conta somente os processos findos, a Segurança Social elaborou "294 autos de contraordenação, 197 propostas de aplicação de sanção acessória de encerramento e 37 de interdição para o exercício da atividade".
Estes números estão relacionados, apenas, com as situações menos gravosas. Isto porque a Segurança Social encerrou, em nove meses, 90 lares de idosos ilegais. Em 23 deles, o cenário encontrado pelos técnicos obrigou ao encerramento com caráter de urgência e à retirada imediata dos utentes, encaminhados, depois, "para respostas sociais alternativas". Outros 39 mantiveram as portas abertas apesar da ordem para encerrar. Todos os casos foram comunicados ao Ministério Público, por estar em causa um crime de desobediência.
Forças de segurança
Alguns destes lares ilegais foram sinalizados na sequência de surtos que forçaram os seus responsáveis a solicitar ajuda. Mas a maioria foi identificada no âmbito de um protocolo que juntou elementos das forças de segurança, da proteção civil e de entidades ligadas à saúde e à segurança social em equipas que percorreram o território nacional.
O presidente da Associação de Lares e Casas de Repouso de Idosos (ALI), João Ferreira de Almeida, mostra-se satisfeito pela intensificação das ações de fiscalização, mas alerta para a existência de um número muito superior de lares de idosos ilegais em Portugal. Serão, estima esta associação, mais de 3000.
"Estava à espera que o número de lares ilegais identificados fosse maior. Já em 2012, estimámos que houvesse entre 3000 e 3500 lares ilegais ou clandestinos", refere João Ferreira de Almeida. O presidente da ALI elogia a fiscalização efetuada, mas pede que esta seja reforçada.
Casos
Paredes
Durante pelo menos quatro anos, 20 idosos viveram num espaço anunciado como sendo uma unidade de turismo rural de Paredes. Só quando, em outubro, três idosos ficaram doentes é que se descobriu que se tratava de um lar ilegal.
Gondomar
Uma pessoa morreu e 21 outros utentes ficaram infetados no lar de idosos Paródias & Ternuras, em Valbom, Gondomar, no final de setembro. O lar estaria sobrelotado e ainda em processo de legalização.
Famalicão
Onze idosos foram retirados de um lar ilegal de Famalicão e transferidos para um Centro de Acolhimento Temporário, no âmbito da pandemia da covid-19.
Pormenores
Soluções
O protocolo de atuação nos lares ilegais identifica "as soluções a adotar nos diversos cenários". "Sempre que há necessidade de se proceder a um encerramento, os utentes são encaminhados para respostas sociais alternativas", diz a Segurança Social.
Regras por cumprir
O presidente da ALI estranha que ainda haja surtos em estruturas, legais ou ilegais, de acolhimento de idosos. "Penso que não sejam cumpridas todas as regras de segurança e higiene", refere João Ferreira de Almeida.