Traficantes neerlandeses libertados sem julgamento disponíveis para enfrentar justiça
Veleiro que escondia mais de uma tonelada de cocaína foi abordado, em alto mar, pela Marinha e PJ sem autorização da Polónia, país onde o barco estava registado. Defesa dos suspeitos pretende que legalidade da operação seja dirimida no Tribunal Internacional do Direito do Mar.
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Os dois neerlandeses que tripulavam um veleiro carregado com mais de uma tonelada de cocaína estão dispostos a enfrentar a justiça portuguesa. Mas, para já, vão recorrer do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que, tal como o JN avançou no último fim de semana, reverteu a decisão de os libertar sem julgamento e exigir ao Estado português que o processo seja decidido pelo Tribunal Internacional do Direito do Mar.
Vítor Carreto e Vítor Parente Ribeiro, advogados de G. S., de 35 anos, e do compatriota J. C., 63, continuam a defender que a abordagem à embarcação, feita em alto mar pelas autoridades portuguesas, foi ilegal e avisam que episódios como o da madrugada de 3 de agosto de 2022 irão causar, mais dia menos dia, um incidente diplomático grave.
O caso remonta ao verão de 2022, quando, no âmbito da “Operação Calypso”, a Marinha e a Polícia Judiciária (PJ) abordaram um veleiro, com bandeira da Polónia, e o encaminharam para o porto de Ponta Delgada, nos Açores, onde as buscas efetuadas confirmaram que o barco transportava 1200 quilos de cocaína.
Os dois tripulantes foram detidos, postos em prisão preventiva e, em fevereiro do ano passado, acusados de “integrar um grupo organizado que se dedica ao tráfico de cocaína da América do Sul para a Europa, com entrada em Portugal”. Contudo, nunca foram julgados.
Na sequência da abertura de instrução requerida pela defesa dos arguidos, os homens acusados de associação criminosa e tráfico de droga foram libertados em junho último, quando o juiz de instrução criminal de Ponta Delgada considerou que toda a prova era nula. Uma decisão que, na semana passada, o Tribunal da Relação de Lisboa reverteu, fazendo com que o processo tenha de voltar ao tribunal açoriano para ser julgado.
Recurso para o Tribunal do Direito do Mar
Embora os neerlandeses já não se encontrem em Portugal, os seus advogados garantem que ambos estão disponíveis para enfrentar a justiça nacional. “Estarão cá para o julgamento se for necessário”, assegura Vítor Parente Ribeiro. Porém, o advogado revela que vai solicitar às autoridades judiciais portuguesas que o processo seja analisado pelo Tribunal Internacional do Direito do Mar. O objetivo é que a prova recolhida pela PJ volte a ser considerada nula. “Não podia haver, como houve, uma abordagem ao veleiro sem autorização da Polónia. Isto só pode acontecer com uma autorização expressa do Estado do pavilhão do barco”, explica.
Também Vítor Carreto releva o mesmo argumento e acrescenta que teria de ser sempre o Tribunal Internacional do Direito do Mar, e nunca o Tribunal da Relação de Lisboa, a dirimir o caso após a decisão de libertar os suspeitos. O causídico não afasta, igualmente, o recurso para o Tribunal Constitucional.
Vítor Parente Ribeiro afirma ainda que abordagens a barcos em alto mar, como a efetuada na “Operação Calypso”, são comuns, mas ilegais se não forem realizadas com autorização do Estado onde o barco está registado. E antecipa um diferendo entre países. “Isto só vai ter um fim quando acontecer um incidente diplomático grave”, alerta.