Um tribunal de Lisboa absolveu hoje da acusação de tráfico de estupefacientes o deputado guineense Manuel Lopes, que, no final do julgamento, disse ter sido alvo de uma "cilada política" e que tenciona regressar ao seu país.
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Manuel Irénio Nascimento Lopes foi detido em maio de 2024 no aeroporto de Lisboa por tráfico de estupefacientes, após terem sido encontradas diversas embalagens de cocaína, totalizando 13 quilos. O arguido, de 57 anos e deputado do Movimento para a Alternância Democrática (MADEM-G 15), arriscava uma pena entre quatro e 12 anos de cadeia. Estava em prisão preventiva desde a sua detenção.
Ao longo do julgamento, Manuel Lopes reiterou que foi alvo de uma "cilada política" por parte do Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, quando um trabalhador da TAP, que identificou como sendo Ivan Sampaio, lhe pediu para ser portador de uma mala para entregar em Lisboa. Ivan Sampaio chegou a ser constituído arguido e interrogado pela Polícia Judiciária, mas foi ilibado por falta de provas. Na leitura do acórdão, o juiz Rui Alves disse não ser possível provar a alegação mas não a descartou, conforme disse no final à imprensa o advogado de defesa Carlos Melo Alves.
"Esse foi o argumento que o Manuel sempre avançou, desde o início, que isto tinha um cariz político, é a versão do arguido do Manuel, que eu acredito nela, e o tribunal, apesar de não ter dado como provado esta versão, também não a descartou, admitindo que pode ser possível, mas também não havendo provas em relação a essa versão. Tudo isto fez com que o tribunal, aplicasse o tal princípio, que é o princípio 'in dubio pro reo' e absolvesse o arguido", explicou Melo Alves.
O tribunal, após a argumentação da defesa e do Ministério Público, "teve dúvidas de que o arguido tenha conhecimento de que transportava com ele a droga, que foi apreendida", aplicando novamente o princípio universal 'in dubio pro reo', acrescentou o advogado. Manuel Lopes, efusivamente saudado no final por familiares e amigos, disse aos jornalistas que não receia regressar a Bissau.
"Não existe e nunca existirá um homem que me impedirá de regressar ao meu país", vincou.
"Sempre acreditei na Justiça portuguesa. Eu conheço Portugal desde 1977. Nunca tive nenhum tipo de incidente. Toda gente que me conhece na Guiné e pelo mundo sabe que não sou dos melhores, mas entre piores não tenho espaço. Tudo isso não passa de uma cilada política. E, graças a Deus, hoje estou livre e estou pronto a regressar ao meu país, onde tenho tanto apoio, onde as pessoas gostam de mim, porque sempre fui trabalhador", sublinhou.
Manuel Lopes fica agora sujeito à medida de Termo de Identidade e Residência até à conclusão do julgamento, o que deverá acontecer dentro de cerca de 30 dias, podendo viajar para fora de Portugal, tendo apenas a obrigatoriedade de dar conhecimento ao tribunal quando a ausência seja superior a cinco dias.
O advogado do deputado, Carlos Melo Alves, destacou hoje, depois de conhecida a decisão do tribunal, algumas "questões estranhas" neste processo, designadamente não terem sido facultadas à defesa, pela Polícia Judiciária, as imagens que comprovam a entrega da mala por Ivan Sampaio, um funcionário da transportadora aérea portuguesa TAP, a Manuel Lopes.
A PJ guineense reagiu num comunicado publicado nas redes sociais, no qual a direção nacional daquela polícia reafirma que "colaborou integralmente com as autoridades judiciais e policiais de Portugal envolvidas neste processo".
A Polícia Judiciária guineense concretiza que, "em cumprimento das diligências solicitadas pelas autoridades portuguesas, procedeu ao envio imediato de todos os elementos requisitados".
"Em particular, foram remetidos aos órgãos competentes de Portugal o registo de videovigilância do Aeroporto Internacional Osvaldo Vieira, em Bissau, bem como cópias de documentos oficiais e demais expedientes que comprovam a verdadeira identidade do suspeito", destaca.
A PJ da Guiné-Bissau enaltece ainda "a sólida cooperação existente com as autoridades policiais e judiciais portuguesas no combate ao crime organizado transnacional, em especial no tráfico de estupefacientes".
"Um outro argumento utilizado pela defesa é que o arguido Manuel, antes de estar detido, já havia a informação que ele estava detido, que é, no mínimo, suspeito no ponto de vista de quem é que podia (...) estar a orquestrar uma situação destas", disse o advogado, referindo-se a mensagens que circularam nas redes sociais.