Homem de 40 anos perdeu um braço já na cadeia, devido a cancro. Medida só surgiu após Tribunal da Relação mandar avaliar condições.
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O Tribunal de Execução de Penas (TEP) do Porto ordenou que um recluso da cadeia de Custoias (Matosinhos), a quem foi amputado o braço direito devido a um tumor com metástases quando cumpria já pena, fosse transferido para prisão domiciliária, com vigilância eletrónica. A decisão, já efetivada, surgiu depois de o Tribunal da Relação do Porto ter mandado avaliar as limitações e a compatibilidade com o meio prisional do homem de 40 anos, dado o estado deste.
O caso foi suscitado por um requerimento ao TEP do Porto da irmã do preso, no qual esta alegava que o familiar estava detido "em condições degradantes e desumanas". O recluso cumpria três anos de prisão por violência doméstica e estava indiciado, noutro processo, por tráfico de droga.
Além de ter dificuldade em alimentar-se, sustentava a irmã do arguido, o homem tinha deixado de efetuar, "de forma adequada e decente, a sua higiene pessoal". Outros reclusos procuravam ajudá-lo a vestir-se e despir-se. No requerimento, a pedir a alteração do modo de execução da pena, acrescentava que a família estava disponível para recebê-lo.
A pretensão foi, porém, rejeitada pelo TEP, que considerou o requerimento "infundado", alegando que as limitações não eram incompatíveis com "a normal manutenção em meio prisional" e que o recluso tinha os cuidados de saúde necessários à sua condição, "como é dever do Estado". Recordou ainda as "fortes exigências de prevenção" associadas.
Atender ao caso concreto
Inconformada, a irmã recorreu para a Relação do Porto, acusando o TEP de fazer "ciência privada", sem um parecer do corpo clínico da prisão, do seu diretor e sem averiguar a situação do arguido.
Na decisão, que o JN consultou, os juízes desembargadores dão-lhe razão, dizendo que, no caso em concreto, "as exigências de prevenção ligadas à prática do crime de violência doméstica não atingem um patamar impeditivo da aplicação da alteração pretendida pela requerente". O arguido fora condenado a pena suspensa, revogada por incumprimento do plano de reinserção social, relativo à sua toxicodependência.
"Impunha-se que o tribunal em obediência aos princípios da investigação e verdade material, perante a situação de detenção do condenado, averiguasse as efetivas limitações advenientes da amputação e doença invocadas, num juízo atual, e compatibilidade das mesmas com a permanência em meio prisional, se necessário através da realização de exames médicos ou perícia médico-legal", salientam os magistrados.
Ao JN, a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais confirmou que, após o TEP do Porto ter revisto a decisão inicial, o recluso passou para prisão domiciliária, um mês e meio após o acórdão do Tribunal da Relação.
PORMENORES
Invocou outros casos
Na rejeição inicial do requerimento, o Tribunal de Execução de Penas do Porto lembrou o caso de outros presos amputados de Custóias "que já passaram" pelo "processo de readaptação" similar ao sentido pelo arguido.
Prisão preventiva
O juiz sustentava, também, que não podia permitir a saída do condenado quando este tinha sido posto em preventiva, por tráfico de droga, à ordem de outro processo.
Prisão só obedece
A decisão de libertar um preso é sempre do juiz e nunca da prisão.