O Tribunal S. João Novo, no Porto, dita amanhã, quarta-feira, o futuro de Marco "Orelhas", do filho Renato e de outros cinco alegados autores da morte, com 18 facadas, de Igor Silva, em maio de 2022, durante os festejos da conquista, pelo F. C. Porto, do 30.º campeonato nacional de futebol.
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Tendo em conta a produção de prova, Marco "Orelhas" e o filho Renato deverão contar com algo próximo dos 25 anos, a pena máxima. Os alegados cúmplices, um deles cunhado e tio dos principais suspeitos, deverão também apanhar penas pesadas.
Somados, são sete os acusados do homicídio de Igor, alem de outros quatro arguidos, de onde se destacam mulheres familiares dos principais suspeitos, estas acusadas de ofensas à integridade física, contra pessoas que terão procurado obstar ao assassínio de Igor.
Os factos remontam à madrugada de oito de maio de 2022, horas depois de o FC se ter sagrado campeão nacional.
Marco "Orelhas", o filho, Renato, e outros membros dos "Super Dragões", rumaram ao estádio da Luz para assistir ao encontro que opunha os dois rivais maiores do futebol luso. Aí chegados, "Orelhas" e o filho, na passagem para os lugares reservados aos portistas, depararam-se com Igor Silva, ele também simpatizante e membro da principal claque portista.
Entre Igor e Marco "Orelhas" - e família - havia um diferendo de contornos violentos. Agressões mútuas, tiros e ameaças subsequentes, ocorridas tempos antes, deixavam no ar a possibilidade de "desforra", entre os dois. E foi exatamente isso que aconteceu na Luz. Ainda antes de o encontro começar, "Orelhas" passou diante de Igor e amigos e, reagindo a "bocas" lançadas, ambos envolveram-se em pancadaria que, com o auxílio de amigos comuns, terminou minutos depois. Durante o jogo, os ânimos viraram-se para o encontro, mas ficaram juras de vingança, que aconteceria, de forma dramática, horas depois.
Com todos a dirigirem-se ao estádio do Dragão, cada um com a sua "guarda pretoriana", Renato Gonçalves, filho de "Orelhas", terá ido para lá armado de faca. O pai chegaria pouco depois.
A vingança começou, "junto das barracas da cerveja", na altura em que a irmã de "Orelhas", avisada do acontecido na Luz, tentou tirar satisfações com Igor. Estavam próximos de uma caravana da "Super Bock", instalada no Dragão. Da prova produzida em audiência, a contenda terá sido apenas verbal, com Igor a fugir do local dizendo que não discutia "com mulheres".
Esta troca acesa de palavras terá provocado um telefonema de familiares a "Orelhas" e ao filho deste, avisando que "o Igor está a bater nela". Renato, morador nas proximidades do Dragão, terá pegado numa faca (que nunca apareceu) e rumou apressado para o Dragão. O pai, Marco "Orelhas", esperou uns minutos pelo cunhado, que o transportou para lá.
Ambos, com a respetiva "guarda", procuraram Igor - que, entretanto, tentava sair do local, com dois amigos e uma namorada. Localizado, alegadamente por Renato e pelo pai, Igor foi derrubado por um amigo de Marco e violentamente agredido, acabando esfaqueado com 18 golpes profundos, no peito e costas. Tombou, numa poça de sangue, para nunca mais se levantar.
"Foi só uma facada"
Pouco depois dos factos, a PJ, com recurso a imagens e testemunhos, abriu uma caça ao homem, neste caso a vários, mas sobretudo a dois: "Renato e ao pai, o "Orelhas". Segundo testemunhas, seriam estes os autores materiais da morte.
Em fuga, só 24 horas depois é que o primeiro, Renato, apareceu. Refugiado em casa de um familiar, mas sabendo-se procurado, decidiu entregar-se na PJ, com o seu advogado.
Ali, como em julgamento, confessou problemas antigos com Igor e que fora ele a desferir-lhe "uma facada". "Apenas uma", reforçou. As outras17, e a ser verdadeiro o seu depoimento, não conseguiu, ou não quis, dizer quem foi, porque fugiu "logo dali", segundo contou.
Já o pai afirmou em julgamento que, quando chegou ao local, conseguiu localizar Igor, envolveu-se em confronto físico e "até foi esfaqueado três vezes". Mas não viu a vítima mortal ser golpeada. Na sua versão, Igor é que teria uma faca que lhe espetou três vezes. Tanto na recolha de prova como em sede de audiência, a sua versão não se ajusta ao acontecido.
A vítima foi esventrada - as imagens do corpo impressionam - e ele, "Orelhas", tinha sangue numa mão e uns "arranhõezitos" nas costas. Disse também que quando chegou ao local - foi de madrugada e estava a trabalhar, quando foi chamado por familiares, coisa que não provou - envolveu-se à pancada com Igor e este é que lhe deu dois golpes de faca - versão que o tribunal não deverá valorar até porque, atendendo às horas, Igor já não se mexia.
Já os alegados cúmplices, ou não estiveram lá, ou "foram apenas para socorrer" o Igor.
É o caso de "Xió" - "apenas esteve lá para assistir aos festejos", segundo a defesa - e Paulo "Chanfra", para quem também o MP pediu pena pesada e que terá imobilizado, pelos pés, a vítima para que não fugisse.
As defesas interpretam de forma diferente as imagens recolhidas na altura e sobre os factos.
Ninguém viu
Atendendo à prova produzida em audiência, na verdade não se consegue identificar, sem sombra de dúvida, o autor das 18 facadas que vitimaram Igor.
Renato confessa "apenas" uma e "nas costas". E que fugiu logo a seguir.
Porém, há uma testemunha que o viu, diz ela, fazer o gesto de "repetidos golpes". O rapaz diz que não. Já o seu pai, o "Orelhas", não viu "nada". E nos exames periciais não tinha qualquer sinal, mesmo microscópio, de sangue da vítima.
Mas a verdade é que Igor morreu esfaqueado de forma inusitada. Quem o fez, uma ou mais pessoas, "foi mesmo para matar".
A procuradora quer pena máxima para "Orelhas" e o filho Renato e "pena pesada" para Xió" e "Chanfra", estes quatro em prisão preventiva.
Quanto aos demais, incluindo mulher e filha do "Orelhas", a representante do Ministério Público pediu pena de cadeia, sem quantificar tempo.