Tribunal europeu considera justa condenação de juiz que recusou candidatura de Isaltino Morais
O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) não deu provimento a uma queixa apresentada pelo juiz Nuno Tomás Cardoso contra o Estado português. O magistrado, que chegou a considerar ilegal a candidatura de Isaltino Morais à presidência da Câmara de Oeiras, garantia que não tinha tido direito a um julgamento justo e que havia sido condenado com base em notícias de jornais e em propaganda política. Contudo, para os juízes europeus, o processo que resultou numa "pena de advertência" aplicada ao juiz foi totalmente legal.
Corpo do artigo
No verão de 2017, Isaltino Morais, já após ter cumprido pena de prisão por fraude fiscal e branqueamento de capitais, anunciou a recandidatura à autarquia de Oeiras e submeteu o processo ao Tribunal de Oeiras para validar o movimento "Isaltino - Inovar Oeiras de Volta".
O juiz Nuno Tomás Cardoso, que estava de turno naquela ocasião, recebeu a documentação e, no início de agosto desse ano, rejeitou a candidatura, justificando que "as declarações de proposituras apresentadas não identificam em qualquer local do seu texto os cidadãos candidatos que integram a lista". Isaltino Morais reagiu com dureza e, em conferência de imprensa, revelou que o juiz que o queria impedir de ser candidato era padrinho de casamento de Paulo Vistas, um ex-delfim que se transformou em candidato opositor à liderança da Câmara de Oeiras.
Já após o Tribunal de Oeiras ter aprovado a candidatura de Isaltino Morais, na sequência de um recurso apresentado por este, o Conselho Superior de Magistratura (CSM) abriu um inquérito à atuação de Nuno Tomás Cardoso e, em junho de 2019, o juiz seria condenado a uma "pena de advertência pela prática de infração disciplinar consubstanciada na violação do dever funcional de prossecução do interesse público".
Condenado com base em notícias de jornais
O magistrado recorreu da sanção, mas viu o Supremo Tribunal de Justiça confirmar a pena aplicada. Sem poder contestar a decisão no sistema judicial português, Nuno Tomás Cardoso recorreu, em dezembro de 2019, ao TEDH.
Invocou, então, o artigo 6 da Convenção Europeia para alegar que o seu direito à presunção de inocência tinha sido violado. Dizia, igualmente, que o processo disciplinar instaurado pelo CSM foi "iniciado com base em notícias de jornais e decidido com base em critérios jornalísticos e na propaganda difundida nos meios de comunicação social, pelo candidato às eleições que não foi selecionado".
Defendeu, ainda, que, em Portugal, não teve direito "a um processo equitativo e a um recurso efetivo", tanto mais que o Supremo Tribunal de Justiça "não tinha efetuado uma revisão dos factos mas, pelo contrário, tinha aceitado os factos tal como estabelecidos pelo CSM, o que resultou numa violação do princípio do contraditório e do princípio da igualdade".
E, por fim, sustentou que "não tinha sido ouvido pessoalmente e que não tinha tido a oportunidade de contradizer o depoimento, entre outros, do juiz presidente".
Processo cumpriu as regras
"Todos os argumentos e questões levantados pelo recorrente [o juiz], incluindo as questões da avaliação da sanção e da alegada exclusão de culpa, foram devidamente ouvidos e examinados pelo Supremo Tribunal de Justiça. Os fundamentos de facto e de direito da sua decisão, que não se afiguram arbitrários ou manifestamente irrazoáveis, foram longamente expostos. De igual modo, nada indica que o processo tenha sido injusto", respondeu, nesta quinta-feira, o TEDH.
Na decisão, consultada pelo JN, os juízes europeus frisam que, "durante o processo disciplinar, o recorrente foi ouvido pelo investigador judicial antes de ter sido formalmente acusado" e que, depois disso, "não pediu ao CSM que o ouvisse pessoalmente". "Por conseguinte, deve considerar-se que o requerente renunciou inequivocamente ao seu direito de ser ouvido pessoalmente", conclui o TEDH que, assim, indeferiu a queixa de Nuno Tomás Cardoso.