
Carlos Garcia garante haver inspetores desanimados
Diana Quintela /Global Imagens
Novo líder sindical da Judiciária quer acabar com cisões entre inspetores e diz que houve "simulacro de negociação" do estatuto com o Governo.
Esteve vários anos como secretário-geral e presidente, passou os últimos quatro fora do ativo e, agora, Carlos Garcia regressa à liderança da Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal (ASFIC) da Polícia Judiciária (PJ). Objetivos principais: ajudar a resolver problemas relativos à falta de meios e à organização do trabalho dos inspetores.
Quatro anos após ter deixado a liderança da ASFIC, voltou a assumir o sindicato. Porquê?
Por entender que podia ser uma mais-valia para a ASFIC, face ao momento que se vivia de conturbação e descontentamento. Candidatei-me com o propósito de voltar a unir os associados em torno de um projeto sindical. Os muitos anos de lutas sindicais conferem-me um reconhecimento que acredito ser fundamental para acabar com cisões.
Como avalia o estatuto e a lei orgânica aprovada antes de iniciar o seu mandato e como avalia a postura da anterior direção?
Não consideramos que o estatuto e a lei orgânica agora em vigor sejam bons diplomas. Quanto ao Estatuto, entendemos que se trata de um retrocesso. Foi uma oportunidade perdida de resolver o problema nuclear da PJ, identificado há mais de duas décadas: a organização do trabalho na PJ. Reconheço as dificuldades da anterior direção da ASFIC, naquilo que considero ter sido um simulacro de negociação. Não tenho dúvida que deu o melhor contributo para conseguir os melhores resultados possíveis.
Tendo em conta existir descontentamento dos investigadores sobre o estatuto, a ASFIC admite recorrer a medidas drásticas? Quais?
A atual direção da ASFIC privilegia o diálogo e a definição do estatuto não está fechada, já que são necessários 19 diplomas complementares, entre os quais alguns que, sendo de negociação obrigatória com o sindicato, serão fundamentais para mitigar os efeitos negativos de algumas medidas. O diálogo está associado a critérios de razoabilidade, adequação e proporcionalidade. Se as pessoas com quem temos de dialogar não nos quiserem ouvir, ou se entrar em simulacros de negociações, não tenho dúvidas de que os associados saberão dar resposta à altura.
Quais são os desafios que os inspetores têm pela frente? Qual é o sentimento sobre o futuro?
É o de responderem a cada vez mais solicitações, mais desgastantes, complexas e perigosas, sendo cada vez menos o número de pessoas para o fazer. São pedidos excessivos sacrifícios sem querer dar a devida recompensa ou sequer admitir a necessidade de se reforçar os meios da PJ. Apesar das bandeiras acenadas de capacitação para aposta no combate à corrupção. O trabalho da PJ vai muito além, já que tem de investigar toda uma criminalidade organizada e violenta. O sentimento atual é de desânimo e de desconfiança, já que não vemos no Governo atitudes consequentes com o discurso que apregoa.
O Ministério da Justiça tem aberto concursos para admissão de novos inspetores. É suficiente?
Os concursos são insuficientes e o ministério sabe disso. Na lei orgânica de 2000 previa-se 1945 inspetores, número que nunca foi alcançado. Passados 20 anos, somos menos de mil. É do senso comum que deveríamos ser hoje o dobro ou o triplo do previsto em 2000.
Quando saiu da liderança da ASFIC em 2016, acreditava existir vontade política de asfixiar a PJ, com falta de meios. Mantém a opinião?
Estou ainda mais convicto que a não atribuição de meios à PJ, bem como um orçamento claramente diminuído e deficitário, que não contempla verbas para a renovação de uma frota automóvel envelhecida ou para o apetrechamento tecnológico, é consequência do próprio trabalho da PJ que incomoda os poderes, entre eles o poder político.
Quando saiu da liderança da ASFIC, o sindicato tinha relações tensas com a direção da PJ. Como estão as relações com a atual?
Neste momento, existe uma relação cordial, de respeito mútuo, como julgo que deve ser, já que queremos o bem da PJ e lutamos por isso. A ASFIC sempre disse que não é um problema; que quer ser sempre parte da solução.
