O Tribunal da Relação de Coimbra aceitou parcialmente o recurso de um militar da GNR que, a 19 de maio de 2019, tinha sido condenado por aliciar, para fins sexuais, uma menor que tinha ido ao posto pedir ajuda, com a mãe, por ser vítima de bullying.
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Os juízes desembargadores mantiveram a pena de nove meses de prisão, suspensa, ao militar, de 48 anos, mas decidiram revogar a inibição de atividade por 18 meses a que tinha sido sujeito como pena acessória.
Para a Relação, a atuação do militar, na altura comandante de um posto em Leiria, constituiu "um grave abuso da profissão", com "grosseira violação dos deveres inerentes", mas foi "um episódio irrepetível", pelo que revogou a medida de interdição de atividade decretada pelo Juízo Central Criminal de Leiria.
No final do ano letivo de 2016/17, uma mãe foi pedir ajuda à GNR por a filha, de 15 anos, estar a ser alvo de bullying. O comandante do posto deu à menor os seus contactos profissionais e pessoais e apelou a que esta o avisasse caso tivesse mais problemas. Em setembro, a menor ligou-lhe a dizer que tinha sido empurrada. A partir daí, as conversas entre ambos passaram a ter um tom sexual.
De meados de novembro até 17 de dezembro desse ano, o arguido enviou à rapariga várias mensagens escritas, por telemóvel e através das redes sociais, "insinuando atos sexuais a praticar com a mesma" e solicitando o envio de fotografias íntimas.
Enviou fotos do pénis à menor
"Face à insistência", por diversas vezes a menor enviou fotos dos seios e vagina e o arguido enviou fotos dos abdominais e do seu pénis. Amiúde, o arguido ainda lhe pediu que fosse ter com ele a sua casa, sugerindo-lhe que pedisse boleia e até "dispondo-se a pagar-lhe a viagem".
A mensagens pararam porque, após uma discussão, a mãe da menor tirou-lhe o telemóvel, viu as mensagens e fez queixa do militar. Em tribunal, a rapariga disse que as mensagens "eram da iniciativa de ambos" e que "não se sentia aliciada para relações sexuais". Já o arguido garantiu que nunca quis ou teve intenção de praticar qualquer ato de natureza sexual e que tudo não passava de um jogo.
O coletivo de juízes de Leiria considerou que tal versão esbarrava na realidade. "O arguido, de forma insistente e persistente, pretendeu convencer a ofendida para que efetivamente fosse ao seu encontro, oferecendo-se até para lhe pagar o transporte", consideraram os juízes concluindo que, perante as fotos enviadas e o teor das mensagens, "não restam dúvidas" e "resulta à saciedade e por demais evidente que tentou de todas as formas possíveis que a ofendida fosse ter consigo visando o que é óbvio, manter com a menor uma relação de cariz sexual".
Em primeira instância, o comandante do posto foi condenado a nove meses de prisão, suspensos na sua execução por um ano, e na pena acessória de inibição de atividade por 18 meses. O arguido recorreu para a Relação de Coimbra, pedindo a nulidade da sentença ou, pelo menos, a revogação da pena acessória, o que viria a conseguir (ler texto ao lado).
MP com "nítido receio" de "condutas idênticas"
Na resposta ao recurso interposto pelo militar, o Ministério Público defendeu a inibição de atividade lembrando que o arguido se aproveitou do exercício das funções para estabelecer e manter contacto com a menor. Mais: ao não apresentar qualquer justificação, o GNR reforçou "o já nítido receio de que venha a praticar condutas idênticas com outra menor". Porém, em dezembro do ano passado, os desembargadores de Coimbra deram provimento parcial ao recurso e consideraram que não se verificava um "fundado receio" de repetição, pois o militar irá "sentir a condenação como uma advertência e não voltará a delinquir", explicaram.
Detalhes
Casado e com filhos
O arguido, na altura comandante de um posto da GNR da comarca de Leiria, é casado há 24 anos, tendo dois filhos, um rapaz de 21 anos e uma rapariga de 16.
Pena de prisão até dois anos
Segundo o Código Penal, o mero aliciamento de menor para encontro com vista à atividade sexual é punido com uma pena de prisão até um ano. Se ao aliciamento se seguirem atos materiais conducentes ao encontro o agente será punido com pena de prisão até dois anos.