O regresso da Justiça à plena atividade, neste mês de setembro, prometia ser animado pelo julgamento do desvio de dezenas de milhões de euros que o Estado destinou a colégios privados do grupo GPS, mas o seu início, que estava agendado para dia 12, foi adiado. Após um mês e meio de férias judiciais, o sistema retoma hoje o seu ritmo normal, com muitos processos escaldantes em mãos e as crónicas incertezas sobre o seu bom andamento.
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No processo dos 25 colégios do GPS com contratos de associação com o Estado, o MP deduziu acusação pelo modo como quatro deles obtiveram os contratos e, por outro lado, pelo desvio de 30 dos 300 milhões de euros recebidos do Ministério da Educação, entre 2005 e 2013, para "empresas terceiras" dominadas pelos arguidos e para os seus "patrimónios pessoais". Mas, em novembro de 2018, o juiz de instrução Ivo Rosa anulou aquela primeira parte da acusação, levando o MP a recorrer para o Tribunal da Relação. E como o recurso só ali chegou neste verão e ainda não foi decidido, o tribunal de primeira instância que deveria iniciar o julgamento na próxima semana decidiu adiá-lo, sine die. O reagendamento só terá lugar após a Relação decidir se José Manuel Canavarro, ex-secretário de Estado da Administração Educativa no Governo de Santana Lopes, e José Almeida, que também foi diretor Regional de Educação de Lisboa, devem ou não responder por corrupção e abuso de confiança. O MP atribuiu-lhes papéis decisivos, o que ambos os homens do PSD rejeitam, na viabilização de contratos de associação do Estado com colégios de Mafra e Caldas da Rainha, antes de o primeiro se tornar consultor e o segundo supervisor técnico do GPS.
"Crucificados" há seis anos
O advogado Mário Diogo, que defende o ex-deputado do PS António Calvete - patrão do GPS e um dos cinco administradores do grupo pronunciados por burla qualificada, falsificação de documentos e peculato - não gostou do adiamento. Porque os arguidos andam há seis anos a ser "crucificados" na praça pública e desejam provar "rapidamente" a sua inocência, justifica, evocando também um argumento jurídico: "Os recursos de despachos de não pronúncia têm efeito meramente devolutivo, não suspendem a marcha do processo".
Ainda assim, aquele ex-presidente do Conselho Regional de Coimbra da Ordem dos Advogados reconhece que, se o julgamento se iniciasse já e a Relação desse provimento ao recurso, "criava-se um grande imbróglio". Ou o julgamento teria de ser reiniciado, ou a parte do recurso teria de ser julgada separadamente.
16 kg de ouro no jacúzi
De resto, o desfecho do caso também será vital para um processo conexo onde António Calvete é investigado por branqueamento de capitais e no âmbito do qual, em junho, lhe foram apreendidos 16 barras de ouro e dinheiro, tudo avaliado em 900 milhões de euros, que tinha escondido nas paredes de um jacúzi.
Para imputar o branqueamento de capitais, é preciso fazer prova de um crime precedente. E, para o MP, aquele requisito é cumprido pelos crimes do processo dos colégios, que garantiram os rendimentos ilícitos ao patrão do GPS. Este ainda não foi ouvido no novo processo, mas deverá alegar que, por não ter nada a temer, até comprou as barras de ouro no circuito legal.
Ano judicial com início em setembro
Antes de 1999 e entre 2013 e 2016, o ano judicial começava em setembro. Agora coincide com o ano civil, embora muitos sintam ainda que é em setembro, quando se dão os movimentos anuais de magistrados e funcionários, que tudo recomeça.
9250 funcionários judiciais e magistrados estão no ativo, aproximadamente. Os funcionários são cerca de seis mil e, nas listas de antiguidades de dezembro de 2018, os magistrados do Ministério Público eram 1626, os judiciais 1407 e os dos tribunais administrativos e fiscais 220.