Família de boliviano revoltada avança com pedido de libertação, alegando que mascar é tradição nacional, mas a posse é crime.
Corpo do artigo
A Polícia Judiciária de Porto deteve no Aeroporto Sá Carneiro um jovem estudante boliviano que trazia na bagagem 1,2 quilos de folhas de coca. Presente ao juiz de instrução de Matosinhos, ficou em prisão preventiva, suspeito de "tráfico internacional de estupefacientes". Mas o caso tem contornos peculiares que, espera a família, poderão levar à sua libertação imediata, na sequência de um pedido de habeas corpus.
Fernando, um jovem de 19 anos, nascido na Bolívia, vive desde bebé na Galiza, Espanha, para onde os pais emigraram há 18 anos. Sem qualquer mácula no registo criminal, diz fonte que lhe é próxima, só vive "para a família e para estudar". Na semana passada viajou, pela primeira vez desde que emigrou, ao seu país natal, na companhia do progenitor. Dois dias depois, e porque "a viagem para Portugal era mais barata", o rapaz regressa a casa, na companhia do irmão mais novo, via Aeroporto Sá Carneiro, onde os esperava a mãe. E foi aí que o caldo entornou.
A passar no controlo da Autoridade Aduaneira, abriram-lhe a mala e, logo à vista, por cima da roupa, três sacos com folhas que o Laboratório da PJ identificou como sendo de coca. O peso: 1,2 quilos. Fernando tentou explicar que aquilo era simplesmente para mascar e para rituais religiosos, no seguimento das arreigadas tradições que ele e a família mantêm vivas. E que na Bolívia pagara apenas seis euros pelas folhas.
A história "não colou", pois a folha de coca faz parte da lista de proibições que constam da lei penal portuguesa. E aquela quantidade já é considerada tráfico. Foi presente ao juiz de turno, no tribunal de Matosinhos, que não esteve com meias medidas e aplicou-lhe prisão preventiva, por, segundo a PJ, haver fortes indícios de "crime de tráfico internacional de estupefacientes, por via aérea".
O rapaz revoltou-se, a mãe gritou, mas de pouco adiantou. Ele foi para a cadeia de Custoias e a progenitora, com o filho mais novo, regressou à Galiza, de onde contratou o advogado português Paulo Pimenta para "livrar o miúdo de tamanha injustiça".
Ao JN, à porta da cadeia de Custoias, o conhecido advogado portuense considerou ter havido "exagero" do magistrado que decretou a mais gravosa das medidas de coação. Paulo Pimenta, salientando que se trata de um jovem "sem mácula", referiu as tradições incas - origem da família de Fernando - onde "o mascar folhas de coca" é tão comum como respirar. Considerando "chocante" a prisão preventiva, o advogado diz que vai apresentar um habeas corpus, exigindo a sua libertação imediata.
Pena
12 anos de prisão é a pena máxima prevista no Código Penal para o tráfico de folhas de coca, que fazem parte da tabela I-B de substâncias proibidas. A pena mínima é de quatro anos.
Pormenores
Advogado espantado
O advogado Paulo Pimenta mostrou-se espantado com a prisão, porque as folhas que o jovem trazia à vista na bagagem custaram 41 bolivianos (seis euros) e porque "com um quilo de folhas de coca, não se consegue fazer droga nenhuma".
Em Espanha "não é crime"
O advogado espanhol, que representa os pais do jovem, garantiu que "em Espanha, o máximo que podia acontecer era pagar uma multa. Não é crime", enfatizou