Há um ano, o país indignava-se em direto - primeiro nas redes sociais, depois nas televisões - perante os cadáveres carbonizados dos 73 animais que morreram no incêndio que trepou a serra da Agrela, em Santo Tirso.
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O fogo devorou dois abrigos ilegais onde havia vários anos sobreviviam centenas de bichos em condições deploráveis. Mas, quando os holofotes saíram de cena, a revolta fez-se silêncio; e, hoje, as associações de proteção animal constatam que o sucedido "não foi um ponto de viragem".
A fúria popular que, após o fogo invadiu o Cantinho das Quatro Patas - onde morreram os animais - e o Abrigo de Paredes, afrontou a GNR, tentou agredir as donas dos espaços (ambas estão a responder a um processo-crime), disparou ameaças de morte e se propôs "fiscalizar" vários abrigos, chegando a invadir alguns pelo país, amainou e não teve tradução direta em adoções. Ou numa continuidade de apoios às associações, após o "boom" que se seguiu ao incêndio.
"Continua tudo na mesma. Não foi um ponto de viragem, de todo, quanto aos abrigos, adoções ou ajudas", testemunha Ana Ceriz, que dirige a CãoViver, na Maia, notando que "o ritmo das adoções continua a ser igual ao que era antes do que houve" em Santo Tirso. "Está como se não tivesse acontecido nada. Não notei qualquer tipo de sensibilidade maior para com a causa, e a nível de ajudas está uma desgraça, o que atribuímos à pandemia", lamenta.
Na Midas, em Matosinhos, ainda vivem 15 dos 32 cães da Agrela acolhidos pela associação, e o número de adoções caiu. "No ano passado, já tínhamos dado 140 animais, e este ano demos 108", contabiliza Lígia Andrade, lembrando que "as pessoas quiseram adotar na pandemia, e, agora, toda a gente quer entregar". "Está tudo pior: há mais pedidos de acolhimento e menos apoio", nota a presidente da Midas, que regista "uma quebra de mais de 60% nos donativos".
mais denúncias
No epicentro da fatalidade de 2020, a Associação dos Amigos dos Animais de Santo Tirso tem, pelo contrário, um "aumento de adoções" e "mais denúncias" de maus tratos. "O incêndio veio, de uma maneira triste, chamar a atenção para os abrigos ilegais e para as pessoas que acumulam cães. Agora, resolver o problema? Não. Vai demorar muito tempo até as pessoas perceberem que não podem deixar que os animais se reproduzam descontroladamente. E isso tem de ser com leis e ajudas. Como o cheque veterinário, que em Santo Tirso funciona bem", vinca a presidente da ASAAST, Fátima Meinl.
Por outro lado, continua por apurar o que falhou ao longo de mais de uma década: apenas o veterinário municipal foi responsabilizado e suspenso de funções, embora os dois abrigos ilegais fossem há vários anos do conhecimento de diversas entidades, desde a própria Câmara até à Direção-Geral de Veterinária (DGAV). Recorde-se, por exemplo, que, entre 2006 e 2013, a GNR levantou 17 autos de contraordenação ao Cantinho das Quatro Patas, os quais foram remetidos à DGAV e à Câmara de Santo Tirso. Mas os abrigos continuaram na serra da Agrela, palco recorrente de fogos no verão, e a bomba-relógio foi saltando de mão em mão, sem que qualquer medida fosse tomada.
Após o incêndio, o Município multiplicou-se em iniciativas na área do bem-estar animal e contratou Hélder Tulha, que vestiu a pele de superveterinário e tem feito verdadeiras maratonas de esterilizações, uma campanha que se intensificou a par das adoções no canil municipal.
PAN lança evento online para lembrar cães da Agrela
A partir das 16 horas de hoje, o PAN lança uma ação, com transmissão online nas redes sociais do partido, para lembrar os animais que morreram no incêndio. A "Ação em memória das vítimas de Santo Tirso" conta com microfone aberto, mediante inscrição prévia, através de entrada na transmissão online para quem esteve presente na Agrela no fim de semana do incêndio. Recorde-se que além do processo-crime em curso, a Inspeção-Geral da Administração Pública abriu um inquérito sobre a atuação dos meios no fogo, e concluiu que não houve infrações. A Câmara instaurou um inquérito interno, mas ainda não há conclusões.
Várias ações
Santo Tirso alargou o horário do canil e passou a apostar forte nas campanhas de adoção e esterilização. Várias outras câmaras têm estas iniciativas e abriram novos centros de recolha de animais. Números disparam
As medidas implementadas pela Autarquia tirsense deram frutos: no segundo semestre de 2020, as adoções no canil subiram 251%, as esterilizações 467% e as vacinas 708%.