A criação de uma zona de comércio livre e do passaporte único continental são os dois temas principais da Cimeira da União Africana, que decorre quarta-feira em Kigali (Ruanda), ideias que, dizem especialistas, têm ainda muito caminho a percorrer.
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Ainda longe do consenso, os 55 países africanos estão basicamente a lançar as bases para uma e outra ideia, pois ainda existem muitos Estados que não as veem com bons olhos, pelo que se abre a porta a que possam avançar apenas com os países que apoiam as medidas.
A Zona de Livre Comércio Continental (ZLEC, na sigla inglesa) permitirá criar o maior mercado do mundo, uma vez que envolverá os 55 Estados membros da UA, com um Produto Interno Bruto (PIB) acumulado a ascender a uns faraónicos 2.500 mil milhões de dólares (2.030 mil milhões de euros).
Mas a criação de uma tal zona, que englobará várias das economias mais dinâmicas do mundo, está longe de obter unanimidade, com o Presidente da Nigéria, Muhammadu Buhari, a constituir-se como o líder da "oposição", facto consubstanciado por nem sequer se deslocar a Kigali para os trabalhos da cimeira.
Para Buhari, quando muito, Abuja aceitará apenas "dar mais tempo para consultas", seguindo à letra as indicações da maior central sindical do país, oi Congresso dos Trabalhadores Nigerianos (NLC, no acrónimo inglês), que defendeu que a criação de uma ZLEC traria efeitos negativos para uma das maiores economias do continente.
"A assinatura da ZLEVC fará bem a África, mas apenas no papel, pois levará ainda muito tempo a entrar em vigor e vai encontrar ainda muitos contratempos", considerou Sola Afolabi, um consultor nigeriano em comércio internacional, citado pelka agência noticiosa France Presse (AFP).
Em Kigali são esperados 27 chefes de Estado, mas ninguém sabe exatamente quantos são os países que vão assinar o acordo para oficializar a ZLEC, que tem de ser ratificado internamente por pelo menos 22 países para entrar em vigor.
O Comissário da UA para o Comércio e Indústria, Albert Muchanga, defendeu, entretanto, que a indústria africana e a classe média do continente vão beneficiar com a eliminação progressiva dos direitos alfandegários entre os membros da ZLEC, lembrando o potencial da ideia, uma vez que apenas 16% do comércio dos países africanos é feito no continente.
"Se acabarmos com os direitos alfandegários, até 2022 o nível de comércio intra-africano aumentará 60%, o que é muito, muito significativo", disse Muchanga, manifestando a esperança de que, no final da cimeira, a ZLEC seja assinada por todos os países do continente.
A ZLEC inscreve-se no quadro de um processo que, até 2028, prevê a constituição de um mercado comum e de uma união económica e monetária de África, razão pela qual também está em curso a implementação do Passaporte Único Africano, tudo incluído na chamada Agenda 2063, que visa desenvolver económica, financeira e socialmente o continente até àquele ano.
Nesse sentido, o presidente da Comissão da UA, Moussa Faki Mahamat, apelou hoje aos chefes de Estado do continente para chegarem a um acordo para aprovar um passaporte único continental que facilite a liberdade de movimento em África.
O passaporte africano é um tema que já é discutido há vários anos na agenda da UA e, quando entrar em vigor, permitirá aos cidadãos dos 55 países africanos viajar por todo o continente sem necessitarem de visto.
Na intervenção, Mahamat pediu aos países que ainda colocam obstáculos à livre circulação, como barreiras aduaneiras ao comércio ou a necessidade de vistos, para que lhes ponham termo.
Em julho de 2016, na cimeira ordinária da UA que também se realizou em Kigali, a UA apresentou o chamado "Passaporte Africano" e defendeu que os cidadãos africanos deveriam começar a recebê-lo ao longo de 2018, mas as negociações nesse sentido ainda estão por concluir.
