Com os sons hipnóticos do tuaregue Bombino, a segunda noite do Vodafone Paredes de Coura reencontrou uma certa dose de apaziguamento que a intensa jornada sonora provocada pelos Alabama Shakes interrompeu.
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Será injusto dizer que, com o músico oriundo do Niger, o festival cumpriu a sua quota de 'world music' na presente edição. O guitarrista autodidata cujo talento já cativou estrelas como Dan Auerbach, dos Black Keys, que irá produzir o seu próximo álbum, é um artista de mérito, distinguindo-se por exemplo de propostas semifraudulentas como Omar Souleyman, subproduto étnico para deleite de massas ocidentais que há três anos tanta euforia provocou neste mesmo festival.
No entanto, não é de todo incorreto afirmar que apenas uma parte diminuta da assistência mostrou empatia com a música do membro da tribo Ifoghas, que convida a uma placidez mais próxima das paragens desérticas de Agadez.
Se, durante a tarde, num concerto restrito para convidados realizado num lugar remoto do concelho, Bombino optou pela versão acústica dos seus temas, ao final da noite, perante largos milhares de pessoas, privilegiou uma vertente mais eletrificada, empobrecendo de forma notória o resultado final.
Desconhecidos até há um ano, os Alabama Shakes construíram nesse tempo uma reputação que poucos julgariam imaginável. Pouco mais de um mês depois da apoteótica receção que obtiveram no festival inglês de Glastonbury, os autores de "Boys & girls" repetiram a dose em Portugal, conquistando a plateia logo a partir dos primeiros acordes, o que apenas veio confirmar as suspeitas de que o palco dito secundário seria manifestamente pequeno para os seguidores do grupo.
Durante uma hora, transformaram Paredes de Coura num lugar perdido do Sul dos Estados Unidos, território com vetusta tradição musical. E mesmo os ímpios ou desconhecedores do género passaram à margem desse encantamento.
A voz quente e rouca de Brittany Howard, bem secundada pelo virtuosismo de Zac Cockrell, Steve Johnson, Ben Tanner e Heath Fogg, mostrou amplo domínio tanto no blues como no gospel, não se furtando até a incursões rock.
Após um início algo titubeante, os Unknown Mortal Orchestra - segunda proposta do dia - entraram em sintonia com nostalgia "60"s & 70"s", mas tiveram dificuldade em por o público a mexer. Demasiadas partes instrumentais e uma guitarra excessivamente floreada e psicadélica não ajudaram. Porém, com "So good at being in trouble" e "Swim and sleep" lá conseguiram cativar a assistência.
O arranque do segundo dia do Vodafone Paredes de Coura esteve a cargo da Discotexas Band, projecto cujo objetivo maior consiste em prestar tributo à homónima editora lisboeta que integra no catálogo artistas como Moullinex e Xinobi.
Em palco, a banda assume uma sonoridade mais orgânica, a que não falta o baixo, a guitarra e a percussão, conferindo dinâmica adicional a uma música concebida em estúdio.
A energia evidente da vocalista Da Chick, com uma reputação de agitadora de massas que extravasa as fronteiras pátrias, não bastou para atear o entusiasmo generalizado entre a plateia. Culpa, quiçá, de um calor excessivo que nem com a aproximação da noite deu grandes tréguas.