Afastada a chuva do terceiro dia, uma multidão superior a 20 mil pessoas despediu-se do Primavera Sound no Parque da Cidade, no Porto, e presenciou atuações marcantes de Dirty Three, Kings of Convenience e The xx.
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A maior enchente da derradeira noite (sábado) do Optimus Primavera Sound no Parque da Cidade ficou a cargo dos xx. O intenso culto de que gozam ficou demonstrado mal entraram no palco, com gritinhos e palmas em doses fartas.
A adulação do trio britânico tem o seu quê de surpreendente, uma vez que a sua música parece mais fadada para recintos fechados, disso se ressentindo o caráter intimista destes temas assumidamente melancólicos. Não que tenham desiludido os seus fãs, mas ficou a ideia de um certo desconforto face a grandes palcos.
Antes, os Dirty Three, liderados por um frenético Warren Ellis, reuniram largas centenas no Palco ATP, talvez o mais belo dos quatro. Numa hora, o hirsuto australiano não deu sossego às hostes, quer ao violino quer ao piano, encetando autênticas diatribes sonoras que cruzavam géneros e entrecortadas apenas por monólogos recheados de ironia.
Um belo concerto numa noite em que as desilusões foram superiores às surpresas. Das primeiras, realce para Lee Ranaldo, que apresentou um naipe de canções formatadas em tudo opostas à espessura patente nos Sonic Youth, a mítica banda de que é guitarrista. Também os Saint Etienne pareceram sempre deslocados no ambiente, incapazes de cativarem a assistência com uma eletrónica que soou amorfa e desconexa.
Apesar do piso enlameado, do cansaço que já começava a instalar-se e até do resultado negativo de Portugal, não houve espaço para grandes depressões. Prova disso foi a simpatia habitual que rodeou os noruegueses Kings of Convenience, tão delicados e expressivos como aconteceu no ano passado no Festival de Paredes de Coura.
Cumprida a primeira edição, fica a certeza de que o Porto ganhou um festival cuja mais-valia para a cidade está acima de qualquer dúvida.
A fasquia dos 75 mil espectadores não foi atingida (com os espetáculos no Hard Club e Casa da Música terá ficado perto dos 70 mil), mas o forte impacto mediático internacional e o predomínio de turistas estrangeiros (bem acima dos 50%) demonstram que a aposta foi ganha.
Em larga medida também graças ao Parque da Cidade, que reúne condições únicas para o efeito. Ao contrário do que acontece em Barcelona - com uma extensão quase interminável de asfalto -, no Porto tudo parece próximo, o que facilita a circulação dos visitantes entre os diferentes palcos.
O impacto de tantos milhares sobre o frágil equilíbrio natural do local só deverá ser avaliado em toda a sua extensão nos próximos dias, mas, pelo comportamento exemplar do público, não parece haver motivo para alarme.
Das seis dezenas de concertos, o 'Primavera' teve também a sua quota de inesquecíveis, como Mercury Rev, Yann Tiersen, Rufus Wainwright, Spiritualized ou The Rapture. Uma variedade de géneros que assenta na perfeição ao ecletismo sonoro do festival.