Com a voz, José Sócrates viveu ontem uma noite de contrastes, no comício da Pontinha, em Faro. Por um lado, foi confrontado por um grupo de manifestantes que, no exterior do recinto improvisado, chamava a atenção contra as portagens na A22, pedia uma auditoria às contas públicas e gritava "Estamos fartos de ser roubados" ou "PS amigo, a dívida está contigo". Por outro, as narrativas foram das mais bem conseguidas da campanha. Tanto a dele, encurtada devido à chuva, como a de João Soares, esta politicamente mais incorrecta.
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Mais uma vez empurrado pelo líder do PSD, Sócrates agarrou-se à entrevista de Passos à Rádio Renascença, na qual defende a revisão da Lei da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) e sugere um novo referendo, para o acusar de mudar de opinião segundo as conveniências e os auditórios. E apanhou-lhe uma contradição, "muito grave". "Numa entrevista ao 'Diário Económico' (Maio de 2008) disse: 'Da primeira vez votei Não (no referendo ao aborto), na segunda votei Sim. Achei que estava na altura de ir mais longe'", citou o candidato socialista. Para concluir: "Respeito quem pensa diferente de mim. O que não respeito é aqueles que uma vez dizem uma coisa e depois outra. Como é que se muda de opinião em matéria de convicções", questionou, atribuindo tal à "disputa intensa entre o PSD e o CDS".
João Soares também quis ser protagonista e, sem papas na língua, acusou Passos de "falta de carácter e falta de consistência". "Queremos como primeiro-ministro um homem de convicções, um homem de carácter", gritou. No mesmo tom, atirou: "Mandaram Eduardo Catroga de férias e chamaram Dias Loureiro. O país não pode ser gerido como foi gerido o BPN. Eles não podem ganhar, senão ainda chamam para as Finanças o dr. Oliveira e Costa".
Tudo isto num dia dedicado às "Novas Oportunidades". Sócrates começou a jornada rodeado de notáveis do PS - Ferro Rodrigues (cabeça-de-lista por Lisboa), Jorge Lacão, Marcos Perestrelo, Alberto Costa, João Proença e Maria de Belém. E para abordar o tema nada melhor do que ir a um centro de formação. Foi na Amadora, onde, desde 2007, já se inscreveram 9000 formandos.
"Ele já chegou, o Sócrates?", perguntava um aluno. "Não, mas chegou aquele outro", ouviu-se. Aquele outro era Ferro Rodrigues, que não perdeu a oportunidade - a palavra é mesmo esta, atendendo ao contexto - para criticar Passos Coelho por ter dito que esta é a "campanha mais desonesta" de que se lembra. O ex-secretário-geral socialista replicou que "os ataques pessoais e de carácter vieram do PSD".
Mais tarde, em Cuba, no Alentejo profundo, voltou às Novas Oportunidades pela mão de uma apoiante que segurava um cartaz dizendo: "Novas Oportunidades não é ignorância".