Airbus e Air France acusadas de homicídio involuntário de 216 passageiros e 12 tripulantes. Empresas incorrem em pena máxima de 225 mil euros de multa. Indemnizações às famílias das vítimas em processo à parte.
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A 1 de junho de 2009, um avião que fazia a rota Rio-Paris com 228 pessoas a bordo caiu no Atlântico. Treze anos depois, o fabricante Airbus e a companhia aérea Air France respondem perante a Justiça francesa.
O julgamento começou esta segunda-feira, às 13.30 horas de Paris (12.30 em Portugal continental), no Tribunal Correcional de Paris. Prevê-se que decorra até 8 de dezembro. Concluirá longos anos de litigância por parte das famílias das vítimas e é já considerado pelos especialistas da aviação civil e da aeronáutica como fundamental para a fabricante Airbus e a para o transporte aéreo global.
O avião do voo AF447 entre Rio de Janeiro e Paris caiu a meio da noite no Atlântico, 3 horas e 45 minutos após a descolagem. Causou a morte dos 216 passageiros e dos 12 tripulantes. Foi o desastre mais mortífero da história da Air France.
Os primeiros destroços e os primeiros corpos foram encontrados nos dias que se seguiram. A fuselagem só foi localizada dois anos depois, a 2 de abril de 2011, a 3.900 metros de profundidade, cercada de montanhas subaquáticos.
As caixas-negras, recuperadas um mês depois, confirmaram que os pilotos, desorientados pelo congelamento das sondas de velocidade numa zona de convergência intertropical, perto do Equador, não conseguiram recuperar a estabilidade do avião, que caiu em menos de cinco minutos.
Arquivado e reaberto
Após uma longa sucessão de perícias, os juízes de instrução arquivaram o caso em 29 de agosto de 2019. Indignados, familiares das vítimas e sindicatos de pilotos recorreram e, a 12 de maio de 2021, a Câmara de Instrução decidiu processar as empresas por homicídio involuntário.
As famílias das vítimas acolhem o julgamento com sentimentos contraditórios. "Não espero nada deste processo", disse à AFP Nelson Faria Marinho, presidente da associação brasileira das vítimas do voo AF447 e cujo filho morreu no acidente, aos 40 anos. O cidadão brasileiro de 79 anos não viajou para Paris por falta de recursos.
Já Danièle Lamy, homóloga francesa da associação de familiares das vítimas, Entraide et Solidarité AF447, espera que o processo, após "uma batalha jurídica", "seja o julgamento da Airbus e da Air France" e não "o dos pilotos ".
"Estamos à espera de um julgamento imparcial e exemplar, para que isso não volte a acontecer e que, através deste julgamento, os dois réus coloquem no centro das suas preocupações a segurança aérea e não apenas a rentabilidade", acrescentou Danièle Lamy.
Para o sindicato de pilotos do grupo Air France, é "importante que um tribunal possa ouvir todas as partes e pronunciar-se sobre as diferentes responsabilidades durante um processo público, onde será destacada a importância da segurança dos voos".
Empresas recusam responsabilidades
A Air France "guarda a memória das vítimas deste terrível acidente e expressa a mais profunda solidariedade a todos os seus entes queridos", lê-se em comunicado da companhia.
A empresa "vai continuar a demonstrar que não cometeu qualquer delito criminal na origem do acidente", apontou.
A fabricante Airbus, que não quis pronunciar-se antes do julgamento, também rejeita qualquer responsabilidade pelo acidente.
O avião, com a matrícula F-GZCP, tinha quatro anos. Transportava passageiros de 33 nacionalidades diferentes: na maioria franceses (61), brasileiros (58), alemães (28) e italianos (9), entre outros.
A pena máxima em que a Airbus e a Air France incorrem neste processo é uma multa de 225 mil euros (em caso de condenação, as indemnizações às famílias serão calculadas em processo à parte). "Evidentemente, para as empresas, é uma gota de água. Mas o que está em causa neste processo é a possível condenação de dois mastodontes da economia mundial. Seria uma publicidade terrível", afirma à Rádio França Internacional um dos advogados das famílias das vítimas, Alain Jakubiwicz.