A máfia siciliana já não é o que era: está difícil recrutar pessoas para um "casamento" sem volta
A associação criminosa Cosa Nostra é, hoje, uma sombra do que foi em tempos. Perdeu elementos, teve de reformular estratégias e abrir-se a outras máfias bem mais poderosas, mas há valores que não mudam: uma vez Cosa Nostra, Cosa Nostra para sempre.
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"A Cosa Nostra [máfia] está viva e presente", sublinhou o procurador Maurizio de Lucia, na sequência de uma mega operação contra a máfia siciliana que terminou, na terça-feira, com a detenção de quase 150 pessoas. No entanto, a organização criminosa tem vindo a adaptar-se aos desafios de uma nova realidade: não está a ser fácil contratar gangsters.
"Não se produzem mafiosos como antigamente", chegou a dizer Giancarlo Romano, conhecido criminoso local, a um sócio - numa conversa que consta das escutas policiais - antes de ser morto a tiro, há um ano. Além da falta de "mão de obra", os métodos tiveram de mudar.
Os novos líderes da máfia passaram a usar telefones encriptados e milhares de cartões SIM de curta duração em circulação pelas prisões, de forma a não serem escutados. As suas atividades focaram-se na criminalidade associada às drogas, branqueamento de capitais e nos jogos online. A Cosa Nostra siciliana começou até a trabalhar com outras associações, nomeadamente a famosa 'Ndrangheta, a mais poderosa da Europa.
No âmbito da megaoperação desta semana, foram emitidos 181 mandados de prisão em Palermo, sendo que 33 dos visados já estavam sob custódia policial. Mais de 1200 polícias estiveram envolvidos naquela que foi, para a comunicação social, a maior operação contra a Cosa Nostra desde 1984. O desempenho policial mereceu elogios da primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, segundo a qual ficou comprovado "o compromisso constante do Estado na lutra contra o crime organizado".
Embora os líderes da Cosa Nostra tentem, atualmente, resolver as disputas pacificamente para não darem nas vistas, a Polícia encontrou armas e reconheceu haver relatos de espancamentos brutais. A investigação também desvendou uma ampla rede de informadores, sendo que em novembro passado, por exemplo, um funcionário da procuradoria foi detido por divulgar arquivos.
Durante muitos anos, a máfia siciliana foi um pesadelo para os civis e o Governo, tendo no cadastro o assassinato dos juízes Falcone e Paolo Borsellino, em 1992. Apesar da clara decadência nas últimas décadas, há códigos que se mantêm, repetidos pelos próprios criminosos: "A Cosa Nostra é como um casamento. Casas com uma mulher e ficas com ela para toda a vida".