Jovem casal de ucranianos pensa em voltar para o país e defender a pátria. Em 2014, Iryna Shcherbatyuk já tinha sido voluntária e deu apoio aos militares em combate, tal como às famílias que perderam tudo.
Corpo do artigo
Lado a lado, com o namorado, Iryna Shcherbatyuk, que fala português perfeitamente - uma habilidade que aperfeiçoou nos últimos 20 anos -, admite que ainda "não consegue processar o que está a acontecer. Isto parece um filme de terror". Com o símbolo do exército ucraniano tatuado no antebraço esquerdo, a jovem avança que está pronta para lutar.
Mais calado e ausente nos pensamentos, há pouco tempo, Stanislav Bondarenko mostrava-se reticente em apresentar-se ao serviço militar do país, mas a cada dia que passa essa necessidade revela-se mais evidente. Já Iryna, nunca teve dúvidas. Depois de em 2014, após a anexação da Crimeia, os russos invadirem a zona leste da Ucrânia, viu a sua veia resiliente vir ao de cima. A passar férias na terra natal sentiu a necessidade de permanecer. Deparando-se com um cenário de conflito, onde as carências surgiam por todos os lados, a jovem que agora tem 28 anos, deixou-se ficar por três meses. Não esteve na linha da frente de combate, mas juntamente com outros voluntários foi recolhendo bens, alimentos, medicamentos e dinheiro para aqueles que estavam a lutar pelo país.
Oito anos depois nada mudou, pelo menos no que diz respeito à sua força de vontade. "Estou a fazer vaquinhas entre amigos para mandar dinheiro para lá. Já consegui enviar 230 euros. Estamos a tentar juntar tudo o que conseguimos", garante, lamentando que o cenário é, nos dias de hoje, mais complexo. A dificuldade tem sido mobilizar os bens que são recolhidos e fazê-los chegar a quem mais precisa. De Portugal até à Ucrânia a distância é longa e as alternativas são cada vez menores. Só lhe resta pensar em ir para lá. Voltar a fazer voluntariado é uma hipótese que está dada como certa, mas no meio de desespero surgem outros pensamentos. "A minha vontade é pegar numa arma e ir lutar", admite, realçando que tem noção de que a violência deve ser controlada de forma "racional", até porque "a guerra no século XXI não se combate só com armas", argumenta.
As malas, o passaporte, e até um saco-cama, já estão postos de lado e prontos para rumar até à Ucrânia. Questionada sobre qual será o ponto da situação que a fará seguir caminho, reflete na resposta, até porque "aconteceu tudo muito rápido". Assegura, porém, que na altura em que o exército ucraniano começar a ter falhas humanas será o momento para partir.
Atualmente, o Governo de Kiev está a exigir que os homens permaneceram em território nacional, sendo que só as mulheres e as crianças devem movimentar-se de forma a protegerem-se de ataques. Se quando chegar lá não puder fazer mais nada, Iryna garante que vai usar as suas melhores competências para ajudar no que conseguir. "Eu conduzo bem, se for preciso ir transportar pessoas ou bens é algo que estou disposta a fazer" afiança.
Iryna, que tem "uma grande família" a viver na Ucrânia, diz que a maior parte está protegida, uma vez que vivem em pequenas aldeias afastadas dos confrontos que se vivem nas grandes cidades. Stanislav não pode dizer o mesmo. Embora a maior parte dos familiares tenham saído de Lugansk em 2014, cidade do leste do país, o jovem de 38 anos sofre com o medo do que poderá ser o futuro do irmão, que se encontra em Kiev e "já tem na sua posse armas e munições. Está pronto para o que der e vier", refere Stanislav.
A incerteza e a impotência invadem os rostos do casal de imigrantes e uma simples chamada pode agora mudar o rumo das suas vidas. A esperança, essa, ainda existe. Iryna sustenta que com o apoio do Ocidente, juntamente com "a vontade dos ucranianos de combater", ainda podem assegurar a soberania do país, que está a mergulhar num conflito pensado minuciosamente por "uma pessoa doentia", lamenta, referindo-se a Vladimir Putin.