Integrantes do Cartel de Sinaloa, uma das mais relevantes máfias criminosas do México, foram calorosamente recebidos por uma comunidade do sul do país, onde prolifera a presença de gangues, responsáveis por desaparecimentos e recrutamentos forçados, perante a inação das autoridades.
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Não é um rei que chega, nem é o Papa, nem é uma parada militar, nem um pelotão numa prova de ciclismo. São narcotraficantes em caravana, aplaudidos e ovacionados em Chiapas, Estado no sul do México, sob o controlo dos cartéis. O momento foi captado em vídeo, numa estrada entre os municípios de Frontera Comalapa e San Gregorio Chamic, e divulgado nas redes sociais, no domingo: as imagens mostram um desfile de homens em uniforme e fortemente armados a serem aclamados como heróis por centenas de pessoas, enquanto as carrinhas de vidros escuros em que se deslocam vão passando pela multidão que os aguarda. Buzinam à passagem e ouvem "Pura Sinaloa" e "Viva Sinaloa" entusiasticamente.
Dois cartéis disputam controlo da região
De acordo com os órgãos de comunicação locais, o desfile foi protagonizado por integrantes do Cartel de Sinaloa, numa zona serrana, perto da fronteira com a Guatemala, onde grupos de crime organizado que disputam as rotas para norte têm intensificado a presença. "Estamos em estado de sítio, em psicose social, com narcobloqueios que usam a sociedade civil como escudo humano", alertou a Diocese de San Cristóbal de las Casas (Chiapas), num comunicado divulgado ontem e citado pela agência France-Presse, ainda antes de os vídeos se terem viralizado.
Segundo a imprensa local, os municípios de Chiapas são, há várias décadas, locais de passagem fundamentais para o tráfico de drogas, pessoas e mercadorias, e são disputados agressivamente pelos cartéis de Sinaloa e Jalisco Nova Geração. Os aplausos dos vídeos publicados esta semana, escreve o jornal "El País", foram interpretados como apoio dos moradores de Comalapa ao grupo de Sinaloa, diante do cerco dos rivais de Jalisco, as duas máfias mais poderosas do país. Mas, qualquer que seja o motivo da receção com pompa e circunstância, facto é que esta mostra a forma como os cartéis têm penetrado cada vez mais nas comunidades do sul do México e o nível de impunidade de que usufruem.
Organizações denunciam inação do Governo
Nem os vídeos nem a denúncia da Igreja mereceram, ainda, manifestação por parte de qualquer autoridade governamental, que também não reagiu ao alerta que a associação empresarial Coparmex emitiu no sábado, denunciando uma série de desaparecimentos, extorsões, bloqueios de estradas e homicídios na região, que afetaram "a prestação de serviços e oferta de bens" e provocaram outros prejuízos, como a suspensão de aulas. A confederação de empregadores pediu ao Governo um programa de ação imediata com vista ao fortalecimento da segurança em Chiapas, mas, para já, não houve resposta.
As organizações de direitos humanos denunciam há muito tempo uma onda de desaparecimentos, recrutamentos forçados e deslocações massivas de populações. Várias sedes municipais da região foram cercadas, desde o início do mês, por grupos criminosos, que cortaram o fornecimento de electricidade e água e provocaram escassez de alimentos e gasolina.