A extrema-direita de Norbert Hofer conseguiu uma vantagem de 3,8% nas urnas, mas falta apurar os boletins por correspondência de 14% dos eleitores, tradicionalmente moderados.
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A imagem pode parecer uma brincadeira, mas o que retrata aconteceu mesmo: convidados a eleger o futuro presidente, os austríacos terão empatado na escolha entre o até agora favorito candidato da extrema-direita - Norbert Hofer, do Partido Liberal Austríaco (FPO) - e o independente ex-Partido Verde Alexander Van der Bellen.
Os 50% para cada lado não refletem o resultado da primeira volta, que deu o favoritismo à extrema-direita, com 35,1% contra os tímidos 21,3% de Van der Bellen. E o empate é técnico: decorre da contabilização, nas projeções, dos 900 mil votos por correspondência, que representam 14% dos eleitores e são, por tradição, desfavoráveis ao FPO. Mas ainda estão por escrutinar.
Ora, o resultado nas urnas (onde se verificou uma abstenção de 30%) teve um vencedor muito curto, mas claro, segundo dados do Ministério do Interior: Hofer conseguiu juntar 51,9% dos votos, contra 48,1% para o independente, mais 144 mil. Só hoje se tirarão as conclusões finais.
A certeza é, porém, uma: seja qual for o vencedor, há uma mudança no panorama político austríaco, que desde o fim da segunda Guerra Mundial alternava entre os sociais-democratas do SPO e os conservadores cristãos do OVP, descartados na primeira ronda. A única exceção foi com a coligação entre o OVP e o FPO do polémico Jorg Haider.
E nenhum dos derrotados indicou sentido de voto para um cargo que tem sido mais representativo do que executivo. Não se senta em Bruxelas; pode determinar a queda do governo e do seu chanceler (e esse é o receio face a Hofer), mas o parlamento pode opor-se e a questão passa para referendo; pode dissolver o parlamento por sugestão do governo. Daí a necessidade de um chanceler assertivo - a nomeação, esta semana, do consensual social-democrata Christian Kern, para substituir um desiludido Werner Fayrman, poderá ter influenciado o aumento de votos em Van der Bellen.
Ainda assim, a hipótese de ser eleito o primeiro presidente de extrema-direita na União Europeia fez tremer o continente, lançando o tapete à ascensão efetiva de partidos radicais em França, por exemplo, e ao fortalecimento de líderes ultraconservadores como o húngaro Viktor Orban. Isto num clima de crescente xenofobia quando a Europa se vê a braço com uma crise de refugiados sem precedentes - com a Áustria, como passagem para a Alemanha, no epicentro do fenómeno.
"Eu não sou uma pessoa perigosa", dizia ontem Norbert Hofer, que na campanha foi apontado como próximo dos defensores de uma "Grande Alemanha". O líder do FPO, ex-engenheiro aeronáutico de 45 anos, opõe-se ao professor e cientista económico Van der Bellen, de 72 anos, em temas centrais como a gestão da crise dos refugiados e a negociação do Tratado Transatlântico para o Comércio e o Investimento entre a UE e os EUA (conhecido como TTIP).