Avô de Émile, detido pela morte do neto, envolvido em caso de maus-tratos em colégio interno
Ao fim de um ano e meio do desaparecimento de uma criança no sudeste francês, a investigação concentra-se agora no círculo familiar. Avós maternos e tios foram detidos. A imprensa francesa resgata um escândalo de maus-tratos em que o avô do menor foi visado, na década de 1990.
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O caso de Émile Solei já tinha esmorecido nas páginas dos jornais, quando, esta terça-feira, a cidade de La Bouilladisse, no sudeste francês, amanheceu com a notícia da detenção de quatro familiares suspeitos da morte da criança. Os avós maternos e dois tios, detidos a quase 200 km de Haut-Vernet, onde aconteceu o desaparecimento do rapaz há um ano e meio, estão acusados de homicídio voluntário e ocultação de cadáver, anunciou o Ministério Público.
Os avós, que estavam responsáveis pelo neto (os pais da criança estavam ausentes), deram o alerta às autoridades, que abriram uma investigação ao caso e mobilizaram para o local vários meios de busca, mas o corpo acabaria por ser encontrado apenas oito meses depois, em março do ano passado. A causa da morte continua por determinar.
"Esta manhã, 25 de março de 2025, Philippe Vedovini e a sua mulher [Anne Vedovini], avós de Emile Soleil, bem como dois dos seus filhos, foram detidos sob acusações de homicídio voluntário e ocultação de cadáver por investigadores da secção de investigação da Guarda de Marselha", declarou o procurador Jean-Luc Blanchon, num comunicado enviado à Agência France-Presse (AFP), que não divulgou as identidades dos outros dois detidos.
Família muito religiosa, "em reclusão" nos últimos meses
Philippe e Anne Vedovini, pais de Marie Vedovini (mãe da criança cujo desaparecimento mobilizou o país), vivem em La Bouilladisse, cidade com seis mil habitantes na região de Bouches-du-Rhône, perto de Aix-en-Provence, onde hoje foram realizadas buscas. Descritos pelo autarca local como "muito religiosos, muito discretos e que vivem de forma relativamente autossuficiente", são adeptos de missas tradicionais em latim, idioma escolhido para o funeral de Émile, e costumavam organizar um concerto de música sacra na igreja de Haut-Vernet, onde passam férias todos os anos. Segundo a rádio francesa RTL, Philippe e Anne - que têm dez filhos - iam regularmente à capela da aldeia, que seria usada somente pelo casal em frente à qual um vaso de plantas foi apreendido pelas autoridades este mês.
Desde o desaparecimento do menino que os avós de Émile têm sido muito comedidos: há meses que vivem "em reclusão", dizem os vizinhos, e só falaram publicamente no dia do funeral do neto, no dia 8 de fevereiro de 2025, ao fim de 19 meses de investigação. "O tempo do silêncio deve dar lugar ao da verdade", declararam na altura. "Não podemos continuar a viver sem respostas. Os recursos legais foram mobilizados, as investigações realizadas e ainda não sabemos o que aconteceu com o Émile desde o desaparecimento. Precisamentos de saber", reagiram então, expressando "profunda gratidão" a toda a comunidade.
Envolvido em escândalo de maus-tratos nos anos 90
Philippe Vedovini, cerca de 60 anos, osteopata de profissão, é visado num caso de violência contra menores na década de 1990, quando trabalhava como supervisor num internato católico para rapazes em Pas-de-Calais. Na altura, era um jovem de 26 anos, fisioterapeuta, decidido a entrar no universo eclesiástico e a tornar-se padre - desejo que acabou frustrado.
O "Le Parisien" cita várias denúncias de maus-tratos feitas por antigos alunos e divulgadas entre 2014 e 2017. Uma investigação jornalística ao caso, publicada em livro em 2022, recolheu vários depoimentos descrevendo Philippe Vedovini como um homem violento e autoritário - fama que continua a rejeitar e da qual se defende evocando a proteção divina.
De acordo com o mesmo jornal, escutas telefónicas levadas a cabo pelas autoridades ao longo dos últimos meses revelaram a existência de fortes tensões entre os pais e avós de Émile.
Padre suicidou-se depois de discutir com avô de Émile
Claude Gilliot, o padre que batizou Émile quando a criança nasceu, pôs fim à vida no dia 15 de março, depois de discutir com o avô da criança. "Diz à minha irmã que a amo, o meu cunhado, amo-os”, escreveu o também professor emérito da Universidade de Aix-Marseille numa carta de despedida, revelada pelo jornal francês "Paris Match". "Estou muito zangada com a família do pequeno Émile, porque acho que tudo começou com eles”, lamentou Claudine Vandenbroucke, irmã do padre, em entrevista à mesma publicação.
O padre tinha batizado Émile quando este nasceu e era muito próximo da família Soleil, mas a relação com os avós e os pais do menino terão mudado quando o pároco divulgou junto da Imprensa uma foto de Émile, aquando do desaparecimento da criança. Nessa altura, os avós e os pais do menino tentaram boicotar a capela e afastar o padre da comunidade, avança a mesma publicação, que adianta que Claude e o avô de Émile trocaram insultos.
A discussão terá levado o reitor da capela a pedir ao sacerdote para mudar-se. “Ele já não dormia. Pediu uma reunião com o bispo. Isto estava a corroê-lo, assim como o facto de já não poder celebrar a missa, ainda para mais na sua aldeia”, explicou a irmã, que recebeu um telefonema da Polícia a 15 de março a dizer que o irmão se tinha suicidado.